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Análise – Flashback 2

Não é frequente termos algum preconceito sempre que uma editora pega numa franquia. Flashback 2 podia ser uma óptima recuperação de um clássico com outra visão mas a Microids não consegue ganhar a nossa confiança.

É óbvio que não podemos esperar que deste tipo de jogos saiam grandes marcos da história dos videojogos. Contudo, o primeiro jogo é um daqueles clássicos que está no nosso imaginário e que nos ocupou por anos. Outros tempos, em que a jogabilidade e o grafismo impressionavam muito facilmente, bastando um pouco de empenho e criatividade. Todavia, já não estamos nos anos 90 e agora o critério de análise é inevitavelmente muito maior. Não nos importamos nada com o conceito de jogos de plataformas 2.5D com uma narrativa interessante. Não nos importamos com uma ou outra cedência técnica num orçamento mais modesto. Mas, como acontece tantas vezes em tentativas de recuperação de franquias. Há jogos que mereciam ficar na prateleira como memórias imaculadas. Trazer de volta estes jogos sem o intuito de os tornar significativos é, no mínimo, injusto para a sua herança.

No seu momento, em 1992, Flashback veio “beber” da inspiração de jogos como Another World, dando uma espécie de continuidade à visão de Éric Chahi, trazendo um ambiente muito seu de ficção científica, no que é hoje descrito como sendo “cyberpunk”. Contudo, Paul Cuisset poderá ter feito apenas um mero “plágio enaltecido”, que se tornou um sucesso por associação. Isto, porque, trinta anos depois, o próprio Cuisset está de volta com esta sequela, numa nova tentativa de criar uma continuidade ao seu êxito original. Em 1995, Fade To Black (nada a ver com Metallica) falhou e a remasterização da Ubisoft em 2013 também.

Por isto tudo, a esperança que Flashback 2 fosse algo positivo era muito baixa. Bastou vermos o que a humilde produtora e editora Francesa fez com Syberia III para percebermos que viria aí algo limitado. Mas, como sempre, o preconceito não tem lugar nesta indústria (ou não devia). Como fãs destes jogos tão icónicos, é óbvio que queremos um regresso positivo, sendo uma boa oportunidade de usar o hardware moderno para criar algo visualmente apelativo e talvez ainda rever a jogabilidade para a modernizar. Era só isso que se pedia, Paul Cuisset e Microids. Mas, nem isso conseguiram trazer.

A história leva-nos novamente ao encontro de Conrab B. Hart, desta vez a acordar de um acidente num planeta. Um amigo seu cientista desapareceu e, uma vez mais, o protagonista só pode contar com a sua pistola AISHA, que tem instalada uma inteligência artificial. A missão é encontrar o seu amigo cientista e tentar perceber o que se passa com uma pretensa invasão de extraterrestres, uns tais de Morphs. Ou seja, esqueçam lá tudo o que se passou com Fade to Black ou com a “pseudo-sequela” de 2013, porque este jogo pega exactamente no final do primeiro jogo de 1992 e ignora completamente a história desses títulos.

Infelizmente, nem é esse o pior elemento da trama. É que o argumento escrito de todo o jogo é francamente superficial, escrito de forma desconexa, com diálogos pouco inspirados, sem nunca criar uma narrativa empolgante ou que queiramos acompanhar. Não ajuda muito que as cenas intermédias sejam compostas por imagens estáticas, com diálogos monótonos e despojados de grande criatividade. É por causa disto que digo que o jogo original foi um pouco uma “associação de ideias” com o conceito de sucesso criado por Another World. Custa-me muito dizer isto mas, sem esse hype, Cuisset simplesmente não chegou lá.

É que, se a história não atinge a marca, a jogabilidade é ainda pior. Nos anos 90, não nos importávamos muito com a história meio obtusa que tivemos. Também nem nos importávamos muito com a interacção limitada ou as animações (agora) toscas que o limitado hardware criava. Mas, estamos em 2023 e não consigo ultrapassar a constante sensação que estou a ver uma jogabilidade de 1992, mascarada de jogo recente. O grafismo foi polido aqui e ali, a sonoridade também mas, se me tivessem dito que este foi um port directo que a produção tentou depois reescrever para contar algo novo, eu acreditava.

Isto fica particularmente evidente nas animações que “teleportam” a personagem para agarrar as plataformas, a orientação da mira usando um cursor que parece ter vida própria ou nas mecânicas de desvio incrivelmente falíveis. Depois, temos um design profundamente ultrapassado dos níveis, extremamente repetitivos e lineares, com uma tentativa constante de criar profundidade no género 2.5D que não faz grandes favores à jogabilidade. Tudo isto junto, cria momentos bastante frustrantes em que queremos só mesmo continuar a jogar mas não conseguimos ultrapassar o aborrecimento.

No fundo, sinto que a produção esteve um pouco perdida no conceito deste jogo, talvez porque achou que devia aproveitar o momento para adicionar algo novo à fórmula ou porque alguém pensou que só fazer uma “sequela” não chegava. Por isso, há imensas secções que tentam em vão surpreender-nos, alterando um pouco a jogabilidade mas nunca realmente nos entusiasmando. E temos outras secções que nem sequer fazem grande sentido, como uma luta entre mechs gigantes e uns poucos cameos um tanto obscuro e que parecem tão fora de contexto que nem perceberão que o são, fazendo apenas franzir o sobrolho.

Mesmo a nível gráfico, fica bem claro que a produção não teve capacidade de fazer mais, dando-nos apenas um ligeiro upgrade visual quando possível mas nada de deslumbrante. Temos, aliás, apenas três opções de detalhe e pouco mais na versão PC (versão analisada). De um ponto de vista puramente nostálgico, eu adorava ter jogado um remake do título original com este grafismo. Todavia, não é nada disto que este jogo pretende ser e acaba por parecer algo reciclado para parecer melhor. Já agora, já tiravam o efeito de “aberração de lente” nos cantos da imagem. Não favorece nada o jogo, como podem ver nas imagens anexas.

Veredicto

É com imensa pena que adiciono Flashback 2 ao lote de jogos menos positivos de 2023. Tudo bem, consegue (ainda assim) não ser tão mau como Gollum ou Rise of Kong, porque até o podemos jogar com uma certa dose de desconto pela origem humilde, que não veio de uma grande franquia a prometer demais. É contudo um sub-aproveitamento de um clássico, numa clara demonstração que (outra vez) esta franquia deveria estar confinada ao nosso imaginário de 1992. Não sei bem se a culpa é da Microids ou do criador Paul Cuisset que simplesmente pode já não ter o que é preciso para trazer algo que mereça a nossa atenção. Seja de quem for, estou desapontado.

  • ProdutoraMicroids / Paul Cuisset
  • EditoraMicroids
  • Lançamento16 de Novembro 2023
  • PlataformasPC, PS5, Xbox Series X|S
  • GéneroAcção, Plataformas
nr
Não Recomendado

Não podemos aconselhar, os detalhes positivos não chegam para esquecer onde falha.

Mais sobre a nossa pontuação
Não Gostámos
  • Jogabilidade de 1992
  • Animações de 1992
  • Enredo de 1992

Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.

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