far_cry_primal-wide

Análise : Far Cry Primal

Viajar no tempo em mais de 12000 anos, até aos primórdios da Humanidade, é o sonho de qualquer antropólogo. Far Cry Primal é um projecto arrojado da Ubisoft, assente na premissa da série que sempre nos deu jogos de sobrevivência violentos e injustos. E nada será mais injusto que ter um tigre dentes-de-sabre no nosso encalço, armados apenas com um mísero bastão.

Em 10000 AC, a Humanidade sai da Idade do Gelo e entra num período chamado de Mesolítico. Uma determinada tribo, que se auto-denomina de Wenja, precisa encontrar um local definitivo para assentar, ameaçados que estão pela extinção. Esse local é Oros, um vastíssimo vale localizado no centro da Europa primitiva. Acontece que Oros é também o local onde residem outras duas tribos que não simpatizam com os Wenja. Ou melhor, até simpatizam… com a sua carne. Os Udam são canibais. Na outra tribo, os pirómanos e dementes Izila não são muito melhores. E não são só as tribos que querem atacar ou devorar a personagem Takkar que controlamos. Se não forem literalmente atropelados por mamutes em fúria, os lobos, tigres, leopardos e outros animais igualmente “simpáticos” também procuram jantar.

Se jogaram os demais jogos da série Far Cry já sabem o que esperar. Esta é mais uma aventura num mapa gigante onde muita coisa nos quer matar. Não vale a pena irem “com tudo” para um objectivo, sabendo que as armas são limitadas, os inimigos são cruéis e as missões são injustamente desniveladas. É preciso conquistar territórios, abrir bases, ajudar os desfavorecidos e, gradualmente, derrotar os inimigos. Também temos de melhorar as nossas armas com o crafting, angariar recursos para melhorar os atributos e evoluir. Tudo em preparação para os assaltos a vilões temíveis. No meio disto tudo, uma fauna persistente e implacável. Todo o ADN de Far Cry está presente neste novo título. Mas há diferenças interessantes no meio de tanta familiaridade.

A principal diferença, logicamente, é o local onde a acção decorre. Longe estão as ilhas solarengas de Far Cry 3 ou as montanhas húmidas de Far Cry 4. Aqui temos florestas densas, quebradas por escarpas, montanhas árias ou rios e lagos. Também não há estradas, veículos ou armas de fogo. Andaremos muito a pé ou com recurso aos animais que domamos (já lá vamos). Para ataque ou defesa, há bastões feitos com troncos e pedras, arco e flechas feitos de ramos, lanças de pedra lascada, facas feitas com osso, entre outras armas. Estas são rudes e no início até são algo frustrantes, com poucas quantidades e fraco alcance ou dano infligido. Terão uma importante ajuda na conhecida visão de caçador para poderem ver recursos, animais ou vestígios dos mesmos, mas, de resto, tudo será novidade.

Até mesmo a língua é estranha, uma vez que a Ubisoft recorreu a especialistas de Linguística para criar uma nova língua Proto-Indo-Europeia, com variantes de dialecto para as três tribos do jogo. Far Cry sempre teve algumas línguas estranhas em jogo. Recordo Far Cry 2 passado no centro de África com os dialectos locais. De facto, esta estranheza faz parte da experiência da série. Notem, porém, que a dada altura até notam que algumas palavras e expressões Wenja são muito semelhantes a línguas modernas. Lá mais para a frente até já poderão entender muita coisa sem ter de ler as legendas.

A jogabilidade é bem mais complicada sem recurso à segurança de um jipe e com uma espingarda de sniper ao nosso lado. Certa vez, dei por mim agachado no mato apenas a escutar ruídos estranhos à volta, identificando dois enormes ursos próximos. Com poucas setas e um mísero bastão, não tinha grandes hipóteses. Tive de, lentamente, esgueirar-me agachado para um riacho… onde fui atacado por uma carpa gigante! Ao fugir da água, o barulho que fiz a correr atraiu um leopardo que me perseguiu vastos metros até conseguir subir uma escarpa. Tinha apenas uns 20 minutos de jogo.

As formas de dar algum equilíbrio a este desnível no combate passam por aumentar a nossa tribo, recebendo missões que nos dão mais pontos de experiência, reunir recursos para evoluir as armas (em poder e quantidade) e… domar os diversos animais selvagens. Começamos por domar uma coruja gigante. Na verdade vamos possuí-la, depois de uma estranha e absolutamente demente “viagem” causada pelo feiticeiro Tensay. Isto significa que podemos controlá-la em voo e usar a sua posição no alto como vantagem. Uma simples coruja pode não parecer muito temível, mas não só será o vosso melhor observador no céu, como com a devida evolução pode mesmo atacar adversários brutalmente.

Poderemos, depois, domar diversos outros animais. Desde os imponentes lobos até aos poderosos ursos, passando pelos leopardos, tigres e até os raivosos texugos (velha piada desde Far Cry 3). Ao início, os animais apenas vos acompanham (podem escolher um de vários que vão domando), atacando inimigos ou caçando animais à nossa ordem. Mais para a frente, poderemos ordenar ataques através da coruja e até usá-los como meios de transporte. Nada ultrapassa a sensação de domar um poderoso tigre dentes-de-sabre e depois saltar para as suas costas e atacar acampamentos Udam, qual He-Man das cavernas. A espada é que dava jeito.

Para evoluir o enredo e justificar as vastas horas que vão passar a apanhar ramos, a ser arranhados por tigres ou quase comidos vivos por canibais, há diversas missões de dificuldade variável disponíveis no vasto mapa. Ou as descobrimos na exploração, ou são-nos dadas pelas diversas personagens secundárias que vamos conhecendo. As missões podem ser de caça de um determinado animal, ataque a um acampamento inimigo, escolta de um grupo de Wenja, angariação de recursos específicos ou simples exploração. A dificuldade é proporcional à experiência ganha, mas convém que a personagem evolua entretanto ou vão ter muitas dificuldades em passar missões mais complicadas.

Essas tais personagens secundárias precisam ser encontradas na região de Oros, como o já mencionado feiticeiro Tensay, a recolectora Sayla que encontramos no início, o tresloucado Wogah que nos ajuda a criar melhores ferramentas, Karoosh que nos ajuda a aperfeiçoar o combate, entre outros. E mais membros da nossa tribo também precisam ser encontrados na nossa exploração e convidados para se juntarem na nossa nova base no extremo do mapa. Todas estas personagens vão aumentar a população dessa base, um acampamento que mais parece uma aldeia. Não só poderemos evoluir essa própria aldeia, como angariar ainda mais missões, recursos e experiência com o seu crescimento.

Só tenho pena que este jogo não nos permita jogar online como nos jogos anteriores, nem que fosse em modo cooperativo. Até creio que havia espaço para jogabilidade multi-jogadores (PvP) entre as três tribos, mas, como isso implicaria novas mecânicas, gostava apenas que fosse possível percorrer o mapa na companhia de um ou mais amigos. É notório que a Ubisoft aposta cada vez menos na jogabilidade online, começando em Assassin’s Creed e agora em Far Cry. Confesso que não sou grande adepto do PvP da série, mas jogar cooperativamente para atacar bases complicadas, era do que mais gostava em Far Cry 4, por exemplo.

Outra questão que surge vem de outros jogos do momento. A questão da sobrevivência. Com um ambiente tão brutal e visceral, curar feridas comendo um pedaço de carne é demasiado simples. Não há uma lógica de urgência realista, não é preciso descansar ou dormir. Gostava imenso de ter uma componente de alimentação ou hidratação obrigatória, no fundo, caçar e colher materiais para sobreviver. Isso aumentaria (e muito) o potencial deste Far Cry Primal e de toda a série, na verdade. Até mesmo o crafting me parece algo simplista. As novas armas só precisam ser criadas uma vez. Ate têm uma duração e quantidades limitadas, mas podemos criar novas com um pressionar de tecla sem grande esforço e com ingredientes rápidos de obter.

Por fim, há que falar das questões técnicas. Olhem para as imagens nestas galerias e digam lá se morrer no Mesolítico não tem óptimo aspecto. O Dunia Engine 2 está cada vez melhor. Desde imponentes árvores, devidamente modeladas e animadas que enchem as planícies verdejantes, às escarpas e montanhas a perder de vista e coroadas com neve no norte do mapa, sem esquecer as sombrias cavernas repletas de pinturas rupestres. Até os modelos e animações dos animais selvagens e personagens, sobretudo em expressões faciais, impressionam. E tudo isto decorre em ambientes fantásticos e credíveis. Os ciclos de dia e noite, a meteorologia dinâmica e os efeitos visuais complementam tudo numa fantástica aventura visualmente deslumbrante.

A nível sonoro é igualmente irrepreensível e competente, com os ambientes diversos devidamente replicados. Desde o eco de qualquer movimento uma solitária caverna à cacofonia de uma tempestade numa floresta, sem esquecer os temíveis uivos nocturnos das alcateias de lobos. A banda-sonora é, logicamente, primitiva e resume-se a grunhidos e batuques diversos, mas o que esperavam?

Notem que a versão analisada aqui (Xbox One) poderá nem ser a melhor de todas. A edição em PC só chega na próxima semana. Prevemos que seja essa a versão definitiva deste jogo. No entanto, nas consolas não deixa de ser visualmente bonito e tecnicamente competente.

Veredicto

Este jogo foi a grande surpresa da Ubisoft no ano passado. Ninguém esperava este regresso aos primórdios da Humanidade. Talvez devido ao foco em lançar um jogo completo, competente e que ofereça algo de novo à série, apenas temos um modo de carreira a solo disponível. No entanto, mesmo sem modos online, Far Cry Primal sobrevive bem aos elementos. O seu combate tem todos os ingredientes que gostamos da série, adaptados a uma altura histórica em que apenas paus e pedras faziam a diferença. Podia ter mais desafio com as mencionadas melhorias na questão da sobrevivência e dificuldade. Mas o que oferece é suficientemente desafiante de tão violento e brutal. Como os demais jogos da série, vicia! E agora, se me permitem, vou só chamar a minha pantera e vou caçar um mamute…

  • ProdutoraUbisoft
  • EditoraUbisoft
  • Lançamento23 de Fevereiro 2016
  • PlataformasPC, PS4, Xbox One
  • GéneroAcção
?
Sem pontuação

Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.

Mais sobre a nossa pontuação
Não Gostámos
  • Seria bom um modo cooperativo
  • O enredo é mesmo muito superficial
  • Não é realmente um jogo de sobrevivência, mas podia ser

Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.

Comentários