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Análise – Far Cry: New Dawn

Hope County está diferente. Far Cry: New Dawn até continua a fórmula que Far Cry 5 nos trouxe mas dá-lhe outra experiência. “Bebe” de imensas inspirações, mantendo a familiaridade que estamos todos à espera. Ainda assim, este Far Cry é de outra espécie.

Embora por vezes houvessem referências entre jogos, os Far Cry nunca se “tocaram” em termos de enredo ou de locais. O primeiro (ainda pela mão da CryTek) foi uma ode à acção em mundo aberto, decretando o mote para o que veio a seguir. Depois, veio Far Cry 2, passado em África no meio de mercenários. Far Cry 3 regressou a uma ilha paradisíaca pejada de gente doida, sendo para muitos (ainda) o melhor da série. Far Cry 4 foi para os Himalaias, praticamente só para libertar torres. Far Cry: Primal levou-nos aos tempos primitivos para lascar pedra. E Far Cry 5 levou-nos para os EUA contra um culto fanático religioso. Onde estes jogos, realmente, faziam pontes, era na sua acção, lógicas e mecânicas de jogo tão semelhantes. Com New Dawn há, de facto, uma alvorada diferente. Esta é uma sequela directa do último jogo, o que tanto pode ser bom como… nem por isso.

Se não jogaram Far Cry 5, deviam. Não só deviam jogá-lo, na verdade deviam terminar a sua história demente, a tal luta de um agente policial contra uma inteira seita religiosa armada. O final dessa trama, lamento o spoiler, é trágico. A seita Project at Eden’s Gate detona bombas nucleares que devastam toda a região de Hope County, parecendo um fim apocalíptico. Mas não foi, de facto. Dado que tantos elementos nesta região eram dados ao “prepping”, um fenómeno social em que muitos constroem abrigos e angariam mantimentos para uma “catástrofe”, muitos habitantes sobreviveram a esta tragédia.

Este mundo devastado, estranhamente, até está pouco irradiado, o que é uma contradição se foi atingido por explosões nucleares. Não temos informações de doentes de radiação ou mutantes e toda a gente parece muito feliz e saudável, com povoações emergentes a tirar partido desta nova paz aparente. Curiosamente, só mesmo os animais sofreram bem na pele o efeitos da radiação. Literalmente. Muitos seres vivos têm mutações que os desfiguraram e deixaram… coloridos. O mesmo aconteceu com a vegetação que tem uma estranha tendência para os tons rosa. Mas, os humanos? Nada. Se calhar a radioactividade tem propriedades rejuvenescedoras, ao ponto de algumas personagens quase nem terem envelhecido desde o jogo anterior, 17 anos antes!

Contudo, ao bom jeito de Far Cry, há quem não goste desta paz. As irmãs Mickey e Lou criam um bando de marginais que devem visto todos os filmes de Mad Max, a ponto de conduzirem carros cheios peças a mais e usarem toda a sorte de roupas esquisitas. Coloridas, claro. De preferência, já sabem… cor-de-rosa. Eventualmente, os sobreviventes desta região precisam de ajuda contra as irmãs e os seus Highwaymen (de notar que não há auto-estradas, ou “highways”, em Hope County). É então que decidem apelar a um grupo de benfeitores que anda a percorrer os EUA de comboio, a ajudar a erguer comunidades. Imaginem-nos como uma espécie de “Exército de Salvação” mas, realmente armados.

E é aqui que entramos. O tal comboio é atacado e forçado a descarrilar para que os highwaymen possam saquear os mantimentos e armas a bordo. E lá pelo meio, estamos nós, um membro desta equipa, que temos de fugir das balas. Nessa fuga, acabamos por chegar a Prosperity, o maior povoado de Hope County onde revemos caras familiares, como a família Rye, o Pastor Jerome e tantos outros. Lá, é-nos dada a incumbência de fazer esta comunidade crescer, angariando pessoal e recursos, assim como rechaçar os ataques das irmãs coloridas. Só que, lá mais para a frente, concluímos que precisamos de ajuda… Se calhar, precisamos de “fé”… E Joseph Seed esfrega as mãos de contente.

Se esta história vos parecer uma espiral, penso que é essa a intenção. No fundo, este é um enredo de sobrevivência, não só aos desafios de uma terra destruída, onde os recursos não abundam, como aos outros levantados pelos que reinam no meio do caos. Ou seja, é a mesma linha de histórias dos demais jogos. Ainda assim, penso que esta história evoluiu de um plano menos elaborado. Se acabaram Far Cry 5, terão a mesma opinião que eu: Joseph Seed não teve um merecido ponto final. New Dawn parece um complemento do fim abrupto do jogo anterior. Pode até ter começado como uma simples expansão de história, que ganhou outras proporções. Nada contra, na realidade. Apenas não sei é se justifica todo um novo título com novos antagonistas e novas mecânicas.

É que toda oferta é francamente familiar, com umas pequenas diferenças na jogabilidade, como irão ver mais à frente. É como se a Ubisoft tivesse terminado todo o conteúdo de FC5 e parasse a meio do corredor e dissesse “espera aí…” Não é inédito que um título pegue num mapa do capítulo anterior, modifique-o, altere a jogabilidade QB e nos dê uma acção familiar que os fãs apreciaram, com um toque diferente, aqui e ali. Mas, pela primeira vez na série, este jogo repete uma localização inteira. Ok, temos tudo destruído, áreas devastadas e animais esquisitos pelo meio, além do tal tom cor-de-rosa que o jogo insiste em espalhar por todo o lado. Mas, se não há nada de novo, New Dawn acaba por ser “mais do mesmo”.

Felizmente, há mesmo algumas novidades. Sim, continua a ser um jogo de acção na primeira pessoa em mundo aberto e, de facto, a maioria das mecânicas são iguais ao título anterior. Até mesmo a lógica de libertação de zonas, progressão com pontos de experiência trocados por habilidades, angariação de itens para crafting, etc. Muita coisa está intacta. Até mesmo os “amigos” que nos acompanham e dão aquela mão preciosa quando mais precisamos. Afinal, este é um Far Cry e não era possível mudar esses ingredientes já tão vincados na jogabilidade. As novidades estão noutros lados.

Uma das principais está mesmo em Prosperity. A pequena vila murada precisa de recursos para evoluir, sendo o principal o combustível Etanol. Ou executamos missões ou roubamos cisternas, seja como for, o objectivo é fazer o povoado crescer em dimensão e qualidade com base neste combustível que é, efectivamente, moeda de troca. Centro médico, garagem, canteiros, armeiro, diversas secções podem ser melhoradas, dando-nos assim acesso a melhores recursos, armas, veículos, etc. E todos esses itens precisam, depois, de ser construídos via crafting. Esta nova lógica é interessante, embora torne a jogabilidade menos linear, obrigando-nos a um grind para conseguirmos atacar bases mais difíceis.

Outra novidade interessante aliada a este último ponto, é a compartimentação do nível de dificuldade dos inimigos, sejam humanos ou animais. Entre três níveis, os inimigos podem aumentar de dificuldade consoante o local ou a missão, sendo obviamente proporcional às nossas armas e habilidades. Até mesmo as bases ocupadas terão esta lógica, sendo as mais difíceis de lidar cada vez mais longe de Prosperity (num conviniente canto do mapa). E depois de conquistadas, podemos “devolvê-las” aos inimigos, que voltam ainda mais fortes, dando mais desafio e mais loot para saquear no final. É um esquema interessante, claramente a apontar na longevidade e no grind.

O armamento também é forçosamente diferente. Embora tenhamos armas convencionais, há um forte foco em novas armas improvisadas, que fariam sentido numa terra destruída e com poucos recursos. Contudo, apenas fazemos crafting para criar uma nova arma, sem ter qualquer intervenção no seu aspecto ou efectividade. O que é pena, quanto a mim é um desaproveitamento de uma oportunidade criativa explorada em outros jogos. Na verdade, todas as armas parecem apenas revisões de FC5, algumas com um aspecto bem diferente, mas com funcionalidade igual. Tirando a brutal arma de serras circulares, não há nenhuma verdadeiramente memorável, mesmo com upgrades lá mais para frente.

E o mesmo acontece com os veículos. Já mencionei que a Ubisoft deve ter-se inspirado bastante nas aventuras de Max Rockatansky para criar motas, carros, barcos e helicópteros, tão cheios de peças a mais e cores garridas, que chegam a ser algo ridículos. Contudo, ficamo-nos mesmo pelo aspecto. Uma vez mais, parecem apenas redesenhados do jogo anterior, sem que nenhum se destaque particularmente. Gosto de usar um bom camião com uma metralhadora no topo mas a condução continua a ser francamente acessória e sem grande incentivo, agora em estradas ainda piores. Mais vale ir de helicóptero, aterrar e atacar a pé, na minha opinião.

De resto, contem com diversas missões de angariação de sobreviventes, busca de bunkers com loot (que são, na verdade, puzzles para resolver), caça e pesca para angariar recursos, angariação de coleccionáveis, enfim tudo o que gostaram (ou não) no jogo anterior, agora com outra cara. Continuo a achar (e desde as primeiras acções de promoção que penso assim) que a Ubisoft trouxe inspiração de outros jogos para aqui. Rage 2 é só o mais óbvio, mas também já mencionei Mad Max e é inevitável não sentir a “vibe” de Fallout, menos a falta de radiação… que continua a fazer-me imensa confusão.

No que toca à acção em si, noto que pouco ou nada foi mexido o que tanto pode ser positivo como negativo. Continuamos a usar diversos tipos de armas, entre carabinas, espingardas, pistolas, metralhadores e as já mencionadas armas improvisadas. Também temos explosivos e armas secundárias para os mais diversos fins. Tudo é bastante linear como em qualquer outro shooter. Contudo, tal como no jogo anterior, continuamos sem um eficaz sistema de cobertura, disparar em veículos é uma autêntica ciência e a Inteligência Artificial continua a ser suicida quando baste. Não é que não me tenha já habituado, mas era bom ter havido aqui uma revisão ligeira.

Devo dizer-vos que demorei imenso tempo, isso sim, para me habituar à mira deste jogo. Já não jogava FC5 desde o último DLC, pelo que já não me lembrava do fraco auto-aim que este jogo oferece. Joguei com o comando Xbox e fiquei a lutar com as sensibilidades nos menus por vários minutos. E, confesso, nunca consegui equivaler os controlos de outros jogos do género. Não sei o que se passa com esta mira e até arriscaria dizer que o auto-aim não estava sequer presente na maioria dos casos. O que nas consolas só frustra, honestamente. Nem sabem os problemas de memória muscular que se criam em outros shooters, depois umas horas aos tiros em New Dawn. Enfim.

E a nível gráfico, bom, também estamos “em casa”. Tirando a nova paleta de cores (já mencionei que abunda a cor-de-rosa?), tudo o resto foi claramente reciclado do jogo anterior. E não tenho muito a dizer contra esta opção, na verdade, talvez só apontar a uma certa dose de repetição óbvia. Far Cry 5 foi um jogo memorável, que na versão que analisámos na Xbox One X brilhou em vários níveis. O mesmo acontece em New Dawn na mesma consola. Não seria de esperar algum downgrade visual e também seria pedir um pouco demais que a Ubisoft, em menos de um ano, evoluísse o moto gráfico Dunia substancialmente. O que temos em mãos é competente e tecnicamente bonito.

Também a sonoridade será familiar, sem grandes novidades de assinalar, mantendo a mesma qualidade de efeitos sonoros e vozes de actores. Apenas tenho de apontar a banda-sonora, agora francamente diferente. As músicas country e descontraídas do jogo anterior, dão lugar a temas mais “mexidos”, sobretudo com as odes ao ruído dos highwaymen, entre o hip-hop frenético e a infame sonoridade estranha dos Sul Africanos Die Antewoord aos altos berros. A Ubisoft frisa sempre muito bem o tom da acção bem mais demente destes jogos, também na música. Ainda assim, há momentos que me obrigaram a diminuir o volume. Quando ouvirem “Fatty Boom Boom” pela centésima vez, vão perceber o que digo.

Veredicto

É discutível se estas novidades são mesmo relevantes para vos entusiasmar. As novas lógicas de angariação de recursos para evolução da base, os diferentes níveis de dificuldade nos inimigos e um punhado de alterações visuais (sem esquecer que são cor-de-rosa), até justificam o nosso regresso a Hope County. O seu preço mais reduzido, também o ajuda a encaixar-se nestas semanas loucas de lançamentos. Quem gostou de Far Cry 5, também vai gostar de Far Cry: New Dawn, até para “fechar” essa história um tanto inacabada. Contudo, estes argumentos talvez não cheguem para justificar sequer a sua existência. O que é pena, porque é mesmo um título divertido.

  • ProdutoraUbisoft
  • EditoraUbisoft
  • Lançamento15 de Fevereiro 2019
  • PlataformasPC, PS4, Xbox One
  • GéneroAcção
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Sem pontuação

Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.

Mais sobre a nossa pontuação
Não Gostámos
  • Nada de realmente novo nos tiroteios
  • Alguma luta com a mira
  • Excesso de cor-de-rosa
  • Die Antwoord pela centésima vez

Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.

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