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Análise – EA Sports F1 24

Inevitavelmente, aí está mais uma edição do jogo oficial do campeonato do mundo de Fórmula 1. Os fãs não se importam nada de comprar um jogo por ano e a Electronic Arts e a Codemasters lançou já EA Sports F1 24.

Contudo, ao longo de décadas, todos os jogos sazonais de desporto têm um sério risco de cair na banalidade. Depende muito da produtora e da sua ambição mas é notório que os títulos anuais de futebol, basquetebol, ténis, etc, acabam por actualizar as equipas desse ano e adicionar uns “pózinhos” para justificar a nova compra, que nem sempre é realmente justificável. No caso dos desportos motorizados as coisas são um pouco diferentes, uma vez que os avanços tecnológicos dão incríveis “boosts” de performance ou de visual, sem esquecer também as alterações técnicas aos veículos reais que terão de ser replicadas em jogo. A Codemasters tem sido exímia a exceder-se a cada ano com algo novo e evoluído. Todavia, neste ano a produção começa a acusar o peso da fórmula EA Sports.

EA Sports F1 24 é o resultado de anos de evolução em jogos regulares e sempre muito bem recebidos, com uma licença que sempre foi muito bem cuidada pela Codie, para nos trazer algo continuamente fantástico e evoluído a nível técnico. O visual também sempre acompanhou as evoluções tecnológicas do momento, com a produtora a testar várias fórmulas de jogabilidade e a inserir novos argumentos nestes jogos oficiais. De facto, nunca houve simulação de Fórmula 1 tão realista em termos de performance e visual, desde que a produtora Britânica pegou na franquia. E é bom que assim seja, já que a esta é tida como a “prova raínha” do automobilismo.

Ainda assim, não há talento que resista a um ritmo de produção tão elevado. A Codie é uma produtora fantástica de jogos de competição automóvel, não precisando de mais reconhecimento em tudo o que fez. Mas, tendo neste momento as duas franquias mais “potentes” do desporto motorizado, a Fórmula 1 e o WRC, por mais dinheiro que seja injectado pela EA, por mais responsabilidade que seja imposta por lidar com licenças oficiais, por mais que a equipa queira produzir ao seu mais alto nível, chega-se a um ponto em que o ritmo abranda. É impossível continuar sempre a inovar, trazendo sempre algo verdadeiramente novo ou que, pelo menos, crie sempre um jogo distinto.

Começando pelo modo que mais atrairá jogadores, o modo de carreira deste ano foi revisto mas não inclui a célebre aventura “Braking Point” que tem vindo a ser continuada, ano sim, ano não, nesta série. Nesta edição, temos o tradicional modo a solo ou para dois jogadores entrarem numa equipa, com pilotos reais ou fictícios, sendo ainda possível criar uma equipa de raiz para competir com as demais. É também possível começar na Fórmula 2 e evoluir para a prova principal, tendo apenas atenção que a época 2024 da F2 ainda não está em jogo (só a de 2023). Ainda teremos umas quantas cenas animadas, contudo, todo aquele drama e “missões” especiais coreografadas de “Braking Point” estão ausentes.

A minha apreciação de “Braking Point” foi sempre mista. Por um lado, toda a luta por um lugar no pódio e os jogos de bastidores, decisões complicadas e egos exacerbados, constituem uma boa história para nos envolver no “glamour” da competição ao mais alto nível. Por outro, pode tornar-se algo enfadonho para quem comprou um jogo de condução e não quer “um RPG”. Também concordo que o modo de carreira tradicional é a melhor forma de jogar este tipo de jogos. Contudo, não deixo de considerar um retrocesso sempre que algo tão elaborado é removido numa edição posterior. A ausência de um modo de carreira mais “teatral” também amplia o “desinvestimento” patente noutros lados.

Dos elementos que menos gostei do modo de carreira que temos em F1 24 é um claro facilitismo em tudo. Quis realmente apreciar a dificuldade inerente em jogo mas… nunca a encontrei. Escolhendo o modo de dificuldade intermédio (que o jogo recomenda), entrando na Fórmula 2, pensei que teria um progresso complicado, a lutar por pontos e a não conseguir chegar ao pódio. Contudo, desde cedo consegui as cobiçadas “pole-positions” e ganhei provas, tornando a minha carreira curtíssima na F2, sendo contratado muito cedo para a F1. Até me dei ao luxo de escolher uma equipa, optando pela modesta Williams para ver se o desafio era maior no escalão mais alto.

Não foi. Entrando nesta equipa mediana, pensei que estaria sempre no meio da grelha a tentar evoluir o carro para chegar mais longe. Até defini um plano modesto de melhoria da minha reputação em apenas dois ou três pontos. Contudo, logo na primeira prova… “pole-position” e vitória. Algo não estava bem. Nos anos anteriores, não era muito difícil competir com os melhores numa carreira que, por vezes, era até algo injusta mas, mesmo assim, havia uma “luta” possível para lá chegar. Aqui, notei que os tempos de Max Verstappen estiveram sempre ao meu alcance e não gostei. Acreditem que deambulei bastante pelo menu para perceber o que se passava, estranhando a facilidade. Mas, já voltamos aqui.

Adiante, notei também que o jogo quer mesmo que “odiemos” os colegas de profissão. Bem cedo, somos constantemente comparados com os companheiros de equipa, o que até faz sentido. Mas, depois, notamos que até as percentagens de sucesso na mecânica e performance do carro são afectadas por sermos ou não os “preferidos” da equipa. Mais tarde, o jogo “manda-nos” fazer rivalidades com outros pilotos, dizendo sempre que temos de ser melhores que “piloto X”. Se falharmos nestas rivalidades, o jogo penaliza-nos por atrasar upgrades ou dificultá-los. O que não faz grande sentido. Na vida real não vejo como uma equipa “só gosta de um piloto” quando tem dois para colocar em pista.

Mesmo que isso fosse uma mecânica lógica, notem que se entrarem com uma taxa de rivalidade baixa, por exemplo serem contratados para a McLaren ao lado de Lando Norris, mesmo que ganhem todas as corridas, o piloto principal terá sempre a preferência, os melhores upgrades e as melhores avaliações até dado momento. É como em EA Sports FC 24, quando marcamos 5 golos e duas assistências num jogo mas, por qualquer motivo, não estamos na equipa da semana. Em vez de nos dar luta onde interessa, em pista, com a dificuldade inerente da condução reactiva e exigente da Fórmula 1, recompensando pelas boas prestações, temos de ganhar “na secretaria”, convencendo que somos melhores que o outro via objectivos secundários.

Podemos sempre tentar mudar de equipa sem grandes “estrelas” para nos dar melhores perspectivas. A minha humilde Williams permitiu-me rivalizar mais par-a-par com o meu colega de equipa, dando-me ligeiras vantagens nas melhorias do carro. Não é que fizesse grande diferença a competir, já que, mesmo com um carro notoriamente inferior, estava a dar 2 segundos de vantagem sobre todos os outros, incluindo o campeão Verstappen. Mas, é óbvio que melhorias na potência do motor, aerodinâmica, travagem, etc, são notórias na condução e ajudam bastante a fazer menos erros. Uma vez mais, convém cumprirmos as provas de prática em cada corrida para termos o carro nas melhores condições (e ganharmos pontos de carreira).

Mas, não pensem que vão saltar de equipa em equipa várias vezes, ou que o leque de possibilidades é muito vasto. Como na vida real, os contratos duram uma ou duas temporadas, não sendo possível quebrá-los a meio. Contudo, especialmente se tiverem boas prestações, poderão rever o actual contrato ou participar numa reunião privada. Infelizmente, acho que a produção falhou no intuito destas duas lógicas. A revisão de contrato não nos dá real vantagem, apenas permitindo ajustar ligeiramente os objectivos. Já as reuniões privadas (secretas mesmo) com outras equipas só permitem que negociemos com uma de cada vez, sendo morosas a dar-nos reais perspectivas de carreira.

Não, não queria ter reuniões constantes com todas as equipas interessadas. Contudo, se uma equipa como a Mercedes nos interpela, só podemos escolher “manter” ou “rejeitar” negociações. Se a mantivermos, voltaremos a falar mais tarde, se rejeitarmos, passamos para outra. É uma mecânica escassa, algo falível até, que não corresponde com a realidade. A nossa agente profissional, aquela que está sempre a tentar explicar tudo e não se cala nos menus, já tinha sido despedida se só conseguisse falar com uma equipa potencial de cada vez. Pior, ficamos sempre com a sensação que não vale a pena mudar, porque actualmente… ganhamos tudo com a equipa mediana onde já estávamos.

A alternativa a tudo isto é criarmos a nossa própria equipa, jogando como “player-manager” no modo MyTeam. Isto cria outro tipo de envolvimento, já que, além de personalizar o aspecto do carro e dos próprios pilotos, teremos as rédeas da gestão da equipa e no desenvolvimento de carros e pilotos, deixando de lado as “preferências”. Uma vez mais, substituir uma equipa real pela nossa, só mesmo porque não queremos desvirtuar nenhuma, remove o desejado realismo e imersão neste mundo tão peculiar. Todavia, é para mim a melhor forma alternativa de jogar uma carreira, sendo verdadeiramente algo mais entusiasmante. Envolve apenas uma nova camada de gestão que, para muitos é a dose ideal de imersão que pretendem.

Entretanto, uma nota relativa a essa tal personalização do carro e dos pilotos virtuais. Como em edições anteriores, a maioria dos itens cosméticos estão bloqueados. Para os desbloquear, terão de evoluir no passe de época (pago) ou… comprar na loja em jogo. Os itens desta loja estão todos bloqueados para serem comprados com “pitcoins”, moeda premium comprada com dinheiro real. Se têm a edição especial do jogo, recebem o passe de época e uma quantia considerável de “pitcoins” mas que, obviamente, não compra tudo. Esta situação limita imenso o design de carros e uniformes dos pilotos. Poderão achar que isto é puramente acessório e eu concordo. Contudo, o jogo parece capitalizar bastante neste aspecto visual.

É que, além do modo de carreira, temos o F1 World, onde estão agrupados vários outros modos de jogo, desde “grand prix”, modos online e até modos “ranked” competitivos. E aqui, lá está, personalizamos os nossos avatares, carros e até o logótipo da nossa equipa. Uma vez mais, isto não é o “miolo” da oferta, mas apenas ser possível obter itens via “pitcoin” ou num passe de época é muito limitador. Uma boa parte dos jogadores vai ignorar isto, esperando ganhar itens via passe de época (se o comprarem) e pronto. Mas, outros sentir-se-ão compelidos a tirar a fatiota genérica e a comprar outra. Já sabem o que eu acho das micro-transacções e não vou dissertar muito mais como isto me parece, no mínimo, forçado.

Algo que me desapontou bastante é que a produção não parece muito interessada em criar algo verdadeiramente novo. A fórmula da Codemasters mudou claramente para se estreitar com o modelo de conteúdo da EA e isso é notório na forma como se consolidam os modos de jogo num só “hub”, mantendo os modos de carreira como destaque. Todos conseguirão concluir que isto é puro EA Sports FC/FIFA adaptado à F1. Contudo, a dada altura é preciso dar-nos algo de novo e não apenas “cumprir uma checklist” para lançamento. Compreendo que o ciclo de produção de um ano é curto para inovar mas corre-se o risco de entrar num ritmo de jogos quase iguais de ano para ano, tornando a sua compra complicada de justificar.

Não é justo dizer que EA Sports F1 23 é igual ou melhor que este novo jogo. Mas, de facto, “Braking Point” foi algo diferente nesse jogo anterior, trazendo melhorias substanciais no interface e ainda introduzindo novidades importantes em jogo, como as bandeiras vermelhas. Enquanto que em F1 24, as novidades não são tão impactantes, ficando-se pelo tal modo de carreira revisto e pouco mais. De facto, este jogo parece apenas “continuar” o que F1 23 alcançou, sendo até mais comedido em conteúdo. O que é francamente desapontante para quem todos os anos investe num novo título do seu desporto preferido.

Mas, entre o Pace Car. Estamos a divergir para a gravilha, ou melhor, do assunto que mais me impressionou negativamente: esta facilidade inerente de obter tempos fantásticos e ganhar provas tão facilmente. Penso que o problema está mesmo na grande novidade desta edição, apregoada abundantemente, esta revisão nos comportamentos da condução, a “Dynamic Handling” ou “Manuseio Dinâmico”. Segundo a Codie, esta é uma evolução na simulação da condução e no comportamento dos carros, criando algo que a produtora descreve como sendo mais “realista”. A ideia é criar uma adaptabilidade ao tipo de controlo do jogador, ajudando onde for preciso a bem da imersão. Contudo, penso que o realismo pretendido numa simulação ficou de lado.

A dada altura, alternei entre um vulgar gamepad e um volante só mesmo para ver se as diferenças eram assinaláveis. Não só a resposta nas curvas foi sempre muito domada, como a aderência dos pneus e até as saídas de curva em aceleração me pareceram pouco penalizadoras de erros, independentemente do controlo usado. Tudo me parece correr “sobre carris”, até mesmo saindo de pista ou levando pequenos impactos. Repito, andei a mexer nas opções de realismo onde achei que pudessem haver ajudas indesejadas, como no controlo de tracção ou de direcção, algo que pudesse facilitar. Todavia, continuei a sentir que a condução estava muito facilitada. Também tive a oportunidade de ver como outros carros da IA aceleravam e como disputavam lugares e reparei que o meu carro era sempre o mais rápido ou o mais reactivo.

Acredito que os carros de Fórmula 1 se “agarrem” bem à estrada. Acredito também que têm óptimas respostas de direcção e, a julgar pelo vemos ao vivo, os adversários estão agora bem mais conservadores, a bem da preservação dos carros e das regras apertadas da FIA. Contudo, a inteligência artificial neste jogo é demasiado previsível, arrisca muito pouco a ganhar posições e, pior, não sabe decidir o que fazer quando, por exemplo, se dá uma colisão e os carros ficam atravessados. A opção do jogo é desqualificá-los e pronto, quando um piloto real procuraria sair do “embrulho”. Isto é particularmente complicado em pistas como o Mónaco, onde as posições se alteram muito pouco se a IA não arrisca quase nada.

De um modo geral, a condução nestes jogos sempre foi muito peculiar, única mesmo dada a potência, massa e aerodinâmica destes carros. Não é sequer comparável entre outros géneros. Talvez esteja só a sentir as diferenças de edições passadas, fruto das mexidas da FIA nos carros reais, achando que é um problema na simulação. Sim, os carros reais de Fórmula 1 estão cada vez mais seguros e domados, estamos longe dos tempos das saídas em “slide” das curvas ou das travagens a queimar pneu. Até mesmo o uso de baterias eléctricas para dar um boost adicional (DRS) dão outro tipo de dinâmica às corridas. Mesmo assim, realismo assegurado, esperava mais desafio e mais… emoção na condução. Assim não aconteceu.

O outro lado da “moeda” que estes jogos oferecem, sobretudo aos fãs, é o espectáculo visual que proporcionam. A fórmula “programa de TV” da EA Sports já estava devidamente adaptada nesta série, pelo que nesta edição só veio melhorar ainda mais. Carros, pilotos, pistas e até os efeitos visuais neste jogo estão absolutamente brilhantes, tanto ao sol, como à chuva ou até à noite. É aqui que os anos de experiência e evolução gráfica da Codie pesam bastante, criando um jogo visualmente deslumbrante e cheio de rigor técnico. De facto, na versão analisada na Xbox Series X, este jogo brilhou sempre, tendo momentos que roçam mesmo a realidade, sem nunca perder performance ou acusar o peso do rigor visual no ecrã.

A haver uma nota menos positiva no plano técnico, é para a sonoridade. Não, não estou a falar no ruído dos motores, nas comunicações com a box ou algo assim. Tudo isto tem o devido cuidado sonoro, dando-nos a imersão possível em cada prova. O que falo é da banda-sonora. Antes de mais, gostos não se discutem, ok? Eu posso não gostar dos géneros escolhidos nas faixas de música da EA e vocês podem adorar. Contudo, eu não falo apenas do meu gosto pessoal. É que as músicas são incrivelmente desajustadas, entre a electrónica e o hip hop barato. Estamos longe das músicas genéricas e repetitivas de menu, é certo, mas a selecção é para mim muito desajustada à competição retratada. Pela primeira vez em anos, fui obrigado a desligar as músicas de menu, não só porque não gostava do género, mas porque realmente não se enquadram com a competição.

Veredicto

Como jogo sazonal da actual época do campeonato do mundo de Fórmula 1, EA Sports F1 24 cumpre o objectivo de retratar devidamente os pilotos, as equipas, os carros, as pistas e todas as regras da FIA da época transacta. O que resulta numa representação fiel do espectáculo que estas provas conseguem transmitir. Contudo, com o volante nas mãos, notou-se um facilitismo na condução, uma certa vontade exagerada de ajudar o jogador, resultando numa falta de desafio, mesmo desligando a maioria das ajudas. Por outro lado, a oferta de modos nesta edição é menor, dando-nos praticamente o mesmo jogo de anos passados com a devida actualização anual. O que não é muito positivo para a franquia, é certo, mas não deixa de nos entregar uma das melhores experiências de Fórmula 1 que há memória. Só não esperem grande emoção.

  • ProdutoraCodemasters
  • EditoraElectronic Arts
  • Lançamento31 de Maio 2024
  • PlataformasPC, PS5, Xbox Series X|S
  • GéneroCondução
b
Bom

Equilibrado e com boas ideias, os seus erros não o impedem de brilhar.

Mais sobre a nossa pontuação
Não Gostámos
  • Ausência de novos modos de jogo ou conteúdo
  • Lógica condução e IA demasiado facilitadora
  • Banda-sonora desajustada
  • Cosmética presa a micro-transacções

Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.

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