Insólito – Ubisoft cria Inteligência Artificial para criar argumentos de jogos

Um dos elementos mais críticos nas análises dos videojogos, é mesmo o seu argumento. A histórias da Ubisoft não eram particularmente brilhantes neste campo e, talvez por isso, a empresa Francesa decidiu criar uma IA.

Chama-se Ghostwriter e a Ubi anunciou-a como uma “convergência entre a IA e a criatividade” no seu site oficial. A ideia é que a IA participe na criação de argumentos, uma vez que a empresa diz que os jogos estão a ficar tão grandes e densos que é preciso um programa para ajudar na criação de diálogos e enriquecimento narrativo de personagens e eventos.

Ghostwriter foi criado por Ben Swanson, cientista de desenvolvimento na Ubisoft La Forge, sediada em Montreal, Canadá. Foi o resultado de uma investigação às dificuldades das suas equipas de design narrativo em criar diálogos para NPCs. Swanson concluiu que esta tarefa podia perfeitamente ser feita por uma Inteligência Artificial e a Ubisoft abraçou a ideia.

Contudo, esta também é a empresa que recentemente provocou a ira dos seus trabalhadores por deixar no ar a possibilidade de despedimentos numa contenção de gastos, resultado de uma alegada má gestão que a direcção fez questão de “sacudir para outro lado“. Depois de ver até mesmo greves a acontecer, o assunto ficou algo “dormente” mas agora a discussão ressurge: Estará a Ubi a planear substituir staff de criadores com uma IA?

A Ubisoft esclarece que este projecto não pretende substituir os criativos humanos mas “complementá-los”. Diz o comunicado que “Ghostwriter não irá substituir os escritores de videojogos, ao invés, aliviar um dos trabalhos mais laboriosos destes profissionais: escrever barks”. Este termo “barks” refere-se a diálogos inconsequentes dos NPCs em jogo, exactamente o propósito original de Ben Swanson.

Aliás, a IA apenas gera rascunhos dos diálogos, “frases e sons feitos pelos NPCs, despoletados por um evento, o que dará tempo para os argumentistas polirem a narrativa noutros lados”. Isto não soa a complemento e, sim, parece mesmo uma substituição de responsabilidades. Embora seja provável que haja uma necessidade de supervisão humana no trabalho, há uma clara reorientação de uma parte do trabalho para esta IA.

Por um lado, a implementação de uma IA poderá introduzir conversas (ainda mais) robóticas com os NPCs, uma vez que poderá não entender bem o tom da situação, reduzindo a qualidade possível criada por um humano. O que seria algo que a Ubi verdadeiramente não precisaria, dado que alguns dos seus jogos são mesmo criticados pela narrativa.

Por outro lado, é inevitável que surjam reduções nas equipas de criativos se a IA pode fazer uma parte importante do seu trabalho. E ainda temos de pensar que, se a IA for mesmo exímia nesta tarefa, nada impede a Ubi de um dia decidir expandir as suas capacidades e dar-lhe alcance na escrita dos seu futuros jogos.

E ainda temos de pensar no título dado ao novo programa. Na literatura moderna, a expressão “Ghost Writer” descreve um escritor anónimo que é contratado para escrever um livro ou artigo e outra pessoa assina no seu lugar. Diz-se que muitos “autores” de livros, como algumas personalidades das redes sociais, usam “ghost writing” para escrever as suas biografias e livros com objectivo puramente comercial.

Ou seja, este é um termo usado para quando alguém quer dizer que não foi o autor que escreveu um livro e que, por esse motivo, não tem qualquer legitimidade na sua criação. Por isso, seria bom que a Ubi tivesse escolhido outro título para dar à sua IA. Assim, só coloca ainda mais peso negativo no projecto e na sua imagem.

As inteligências artificiais estão, de facto, na moda. Algumas até já jogam (e fazem batota), numa demonstração impressionante de capacidades. E é previsível que lentamente substituam humanos em algumas actividades, inclusive na criação de conteúdo para o entretenimento. É só perturbador que aconteça numa empresa que está em dificuldades internas com o próprio staff.

Uma IA não protesta, não precisa de ordenado, nem faz greves…