Editorial: Cyber-Bullying

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Ter um website de videojogos é uma oportunidade de, enquanto gamers, expressar-nos, opinar e até avaliar a indústria. Certamente teremos opiniões controversas ou contrárias às tendências actuais, mas também estamos a navegar num mar de opções que agradam ou desagradam a muita gente. Todos nós temos direito a uma opinião, afinal. Mas, quando se trata de comentar um ponto de vista, por vezes surgem, muito além de simples opiniões contrárias, autênticas ofensas, muitas delas dignas de uma queixa na esquadra mais próxima. Até onde vamos com o nosso direito a opinião ou resposta?

Não estou a falar de ofensas em jogo, daquelas banais de como numa sessão os jogadores conhecem as mães uns dos outros e as suas profissões. Nem sequer estou a falar das opiniões contrárias em resposta a artigos que façamos. A crítica, quando construtiva, é sempre bem vinda. Estou a falar daqueles comentários que nem sempre chegam a ler porque um moderador já os apagou. Estou a falar do vulgarmente chamado “flame” de argumentos repescados que acabam em birra ou com ataques pessoais a alguém. Comentários que visam destruir. Opiniões sem fundamento que apenas têm como alvo descredibilizar, desconcertar ou mesmo desmotivar. Isentos de intenção construtiva, meramente humilhadores, jocosos (os tais trolls) ou mesmo passíveis de ferir susceptibilidades.

Aqui no WASD.pt já tivemos a nossa quota de comentários injuriadores e insultuosos. Talvez não tanto como outras comunidades (felizmente), mas já provámos esse lado mais negro da comunidade de videojogos. Recentemente, porém, temos assistido a um enorme fluxo de opiniões e contrapontos absolutamente insultuosos um pouco por todo o lado, originados de pretensos “gamers” que deambulam pelo éter da Internet para espalhar a sua bílis. Isto em respostas a artigos, publicações de fóruns, comentários a vídeos, conversas em jogo. Há até recorrentes, famosos pelos seus vídeos de “deitar abaixo” ou pelos textos quase poéticos, repletos de asneiras e vulgaridade. Felizmente, são muito raros os casos em Portugal, mas também os há.

O que dizer deste fenómeno? Já todos ouvimos falar das “Guerras de Consolas” ou dos “FanBoys”. O termo “vestir a camisola” pertence ao futebol, mas aplica-se em quase tudo. Aqui neste meio não é excepção. Opiniões contrárias e defesa de posições, são normais, espectáveis e até encorajadas. Seria muito aborrecido escrever algo ou defender qualquer coisa para apenas receber acenos de cabeça. Haja o fluir de opiniões diversas e contrárias. Haja clubismo, sim! Mas há um limiar do conflito salutar, da “defesa do meu clube”, que é permanentemente ultrapassado quando estes indivíduos (desenganem-se se acham que são apenas crianças) que torna tudo insuportável, roçando o ridículo. Incomoda, muito. Porque não queremos acreditar que seja sintomático desta comunidade. Não pode representar o que é ser um Gamer… falar mal porque pode! Não pode ser, não me identifico com isto.

Podemos dizer: “ignora!” Claro que ignoro, quase sempre. Por vezes até brinco com a situação e afasto-me ao estilo de quem se desvia de uma rajada de balas. Mas não deixo de ficar triste de pensar que há uns 15 anos atrás nada disto existia. Havia muito poucos locais onde me expressar e quando o fazia era com o intuito de ajudar ou corrigir. Lembro-me de deixar mensagens nos Boards onde se discutiam alguns jogos e de lá obter feedback tanto positivo como negativo. Nunca ser insultado pelo meu ponto de vista. Muito raramente fui atacado pessoalmente pela minha posição ou em relação a uma preferência, por exemplo. E quando era, o trabalho de moderação, quase sempre mero trabalho de manutenção dos fóruns, sanava a situação.

O advento das redes sociais e do acesso fácil à web, fez com que a facilidade de opinar se tornasse uma arma de arremesso. Os comentários construtivos são lentamente trocados pelas opiniões corrosivas e ofensivas, talvez porque exista uma audiência e me pareça que muita gente gosta de palmadinhas nas costas. Ser controverso dá direito a “likes” e encorajamento. É como uma capa de jornal com mortos e sangue que vende mais que a que é mais moderada e conservadora. É um espelho do mundo que nos rodeia, talvez.

Nos limites da liberdade de expressão, porém, insultos racistas, xenófobos ou sexuais são passíveis de queixa-crime, em qualquer ponto do mundo. Mas isso é tantas vezes esquecido nos comentários de um site ou nas redes sociais que quase achamos “normal” e “desculpável”. Toldados por um anonimato apenas possível online, os insultadores estão quase impunes. Por vezes, são banidos dos locais para voltar mais tarde com novas contas ou outros nicks. Pior, dão à luz outros iguais ou piores. Fala-se tanto do bullying das escolas e esquece-se que diariamente crianças e adultos circulam em sites e em jogos online onde o insulto e o tal bullying são prática diária. Não admira que depois tudo transpire para o quotidiano. Os estudiosos dão um título pomposo a este tipo de agressão de “Cyber-Bullying”. Dar nomes às coisas não as resolve, porém.

Não há grandes medidas para combater isto. É quase impossível monitorizar tudo o que se passa nas comunidades. É trabalho de moderação que tem de ser muito delicado para não piorar ainda mais a questão. Ainda mais impossível é colocar rolhas das bocas dos agressores. Parece que isso só os motiva para fazer pior.

Mas então a minha pergunta é: “Onde estão os gamers?”

É que nestes actos, nestas situações vergonhosas e nos ataques pessoais, não vejo gamers. Vejo ou crianças crescidas ou adultos precoces com uma ideia deturpada do que é liberdade de expressão. Uma excelente definição desse direito é “A minha liberdade de expressão acaba quando começa a do próximo”. Sem dúvida, algo a reter na próxima vez que comentarmos ou opinarmos online.

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