ShadowTombRaider (hd)

Análise – Shadow of the Tomb Raider

Esta trilogia, que começou a trilhar caminho em Tomb Raider (2013) e Rise of the Tomb Raider (2015), chega agora ao fim. Este terceiro Shadow of the Tomb Raider mostra que a Eidos Montréal quis que este fosse um final em beleza.

Não deverá ser o fim de Lara Croft, obviamente. Esta trilogia quis servir de prequela para a famosa heroína salteadora de túmulos. São uma espécie de história de origens, que nos mostrou uma Lara inicialmente inocente, mas que lentamente se torna na “máquina de pistolas em punho” que depois viríamos a conhecer nos demais jogos da série. Estes jogos tornaram Lara mais afável, mais terrena, bem menos temerária e ainda menos voluptuosa, diga-se . A Square Enix quis criar uma personagem credível, muito menos sexista e com a qual os jogadores se pudessem identificar. É óbvio que o seu colega salteador Nathan Drake (Uncharted) teve um papel essencial neste reformular da personagem. E não há nada de errado nisso, quanto a mim.

Dois meses depois dos eventos do último jogo, Lara está agora na América do Sul à procura de uma relíquia Maia, seguindo uma nova pista deixada pelo seu falecido pai. Uma vez mais, porém, também a organização Trinity está no encalço dessa relíquia, cruzando caminho com a arqueóloga. Os objectivos são claramente diferentes entre a protagonista e os antagonistas. Lara quer a relíquia para resolver um enigma, a Trinity quer “mudar o mundo”. Numa série de eventos, porém, a heroína tem um acto impulsivo. Um antigo punhal Maia está num suporte, com um aviso tenebroso que não deve ser apanhado. Entre deixar que a Trinity o apanhe ou levá-lo consigo, a escolha parece óbvia. Só que nesse acto irreflectido, um cataclismo é iniciado.

Devo dizer que os primeiros instantes de Shadow of the Tomb Raider deram-me uma certa dose de apreensão. Divido-me a pensar se a estranha familiaridade com a história de Rise of the Tomb Raider é intencional ou uma falta de empenho em criar algo novo. O jogo anterior foi fantástico, um salto verdadeiramente qualitativo e quantitativo do primeiro título. Mas, nos primeiros instantes deste, é inacreditável que o guião soe francamente semelhante entre os dois últimos jogos. A história começa com Lara e Jonah em apuros, depois há um flashback para eventos anteriores que resultam na ausência do tesouro pretendido no primeiro mapa, obrigando-nos a viajar para outro. Então Lara tem de salvar o mundo porque a Trinity tem outros planos mais destrutivos. Enfim, a fórmula é francamente familiar.

Felizmente, a história depois abre e acaba por tomar um rumo um pouco diferente. Mas, foi um mau presságio. Eventualmente, leva-nos para um percurso bem mais visceral e violento. Não vou aprofundar este ponto demais para que vos deixe jogar e descobrir. Mas, numa determinada ocasião, finalmente a jovem inocente Lara Croft emerge (literalmente, depois percebem) como a “bad ass” que desanca meliantes sem dó nem piedade, entre umas piruetas e tiros avulsos. Nesse preciso momento de revelação, notei que a produção quis dar um ligeiro passo atrás, talvez com receio do retrato mais violento dado. Mas, era tarde. A inocência perdeu-se ali mesmo nas selvas do Peru. Assim, há motivo para o título, esta é mesmo a “sombra” da salteadora. Lara é, finalmente, uma heroína e não apenas uma “rapariga a quem a vida é sempre complicada”. E aplaudo essa nova orientação.

Não sendo um particular especialista, acompanhei durante algum tempo alguma da mitologia Maia, Azteca e Inca. Foi com imenso prazer que vi estas civilizações representadas na sua riqueza cultural e artística, mas também na sua crueldade social. Obviamente, há imensas cedências históricas a bem da narrativa. E também é de assinalar que muitas das recriações de templos e ruínas são explorados ao nível de design, para melhor encaixar no visual do jogo. Passando-se maioritariamente no Peru (ainda passamos pelo México), a civilização Inca é a que recebe maior destaque. Mas, há uma mescla cultural, envolvendo até os Conquistadores espanhóis. E é claro que há um forte elemento de fantasia no enredo e nos elementos históricos retratados, jogando até com a infame visão apocalíptica dos Maia.

Entre missões da história principal, voltamos a ter áreas para angariar missões secundárias. Contudo, a diferença é muito significativa. As pequenas vilas que encontramos são, na verdade, autênticos hubs. Não só temos personagens que nos dão missões paralelas, como temos vendedores para comprar e vender equipamento e algumas tumbas opcionais para descobrir. Notem que algumas destas missões paralelas têm repercussões profundas nas aldeias por onde passamos. São perfeitamente opcionais mas podem resultar em ajudar a população nas mais diversas tarefas, ou ignorá-las completamente. Sim, teremos equipamento e bónus como recompensa, mas a nossa marca na povoação também é notória e pode dar-nos uma ajuda extra.

É nas lojas destas aldeias que descobrimos novas armas e recursos, mas também podemos comprar novos fatos com algumas habilidades extra. De notar que as peças de upgrade das armas, como os silenciadores, podem ser aqui comprados. Como sempre, terão de procurar fogueiras que servem para trocar de equipamento, mas também são zonas de evolução, rearmamento e fast-travel. Lara tem agora uma complexa árvore de evolução, com imensas habilidade para desbloquear. Algumas visam dar mais resistência à protagonista, como maior capacidade de respiração para nadar, outras visam apostar mais nos recursos, como uma habilidade que permite carregar mais carga para crafting de setas, venenos e outros itens.

E quando estiverem absorvidos na trama, é inevitável apreciar a jogabilidade revista. Vão andar novamente a trepar, escalar e cair, de arco, pistola, metralhadora ou caçadeira em punho, em busca de segredos e meliantes distraídos. É a mesma fórmula que a trilogia iniciou em 2013 e que funciona muito bem… na maior parte do tempo. Notei que, nos tais minutos iniciais, Lara tinha os mesmos movimentos e animações e até os itens que carrega me pareceram reciclagens do título anterior. Lá mais para a frente, há diversas diferenças na interação que vão sendo introduzidas, felizmente. Por exemplo, Lara pode agora lançar o machado de escalada com uma corda (qual Batman) para se segurar e balancear até à próxima plataforma ou até fazer rappel descendo a mesma corda.

A principal das diferenças na acção é um foco muito mais evidente na acção furtiva, algo que eu simplesmente acho que serve como uma luva a Lara. Não é sexismo, mas estamos a falar de uma jovem de estatura média no meio de uma selva implacável a lutar contra soldados armados. Faz todo sentido que se aposte em tácticas de subterfúgio e guerrilha. Lara pode agora camuflar-se na lama e lançar emboscadas. Pode até saltar do topo de uma árvore ou esconder-se nos arbustos à espera de incautos. Lá mais para frente, poderão armadilhar corpos ou até criar engodos. Nota-se perfeitamente que o intuito é eliminar os inimigos silenciosamente. Até porque, se for descoberta, Lara fica rapidamente rodeada e reforços podem ser chamados. Aí, talvez as armas nos safem… talvez…

Tive imensas dificuldades em gostar do comportamento dos tiroteios. Sim, temos o arco, as pistolas, as metralhadoras e as caçadeiras, além dos ataques melee para irmos mais “directos ao assunto”. Contudo, o tal foco na acção furtiva torna-se gritante, evidenciado nas imensas questões nas mecânicas e balanços a pegar em armas. Para começar, o esquema de cobertura é praticamente inexistente, obrigando-nos a procurar obstáculos mas sem nunca estarmos devidamente protegidos. Os inimigos flanqueiam com demasiada precisão e têm dedo leve no gatilho. Em algumas secções, ser descoberta leva Lara à morte certa, sem hipóteses de fuga. Penso se uma mistura entre design de mapas e a posição dos inimigos poderão estar na origem de alguns estrangulamentos na acção.

É que retaliar fogo é complicado. Joguei numa PlayStation 4 e usei, obviamente, um Dualshock 4. Há qualquer coisa de estranho entre o processo de mira e o tiro em si. Penso que o auto-aim, ou está a funcionar mal, ou nem funciona de todo. Numa determinada secção em que lutamos contra um leopardo, só temos milésimos de segundo para disparar, mas acabei por falhar muito tiros porque a mira parecia lenta a mover-se e não parecia “bloquear” no animal. Mesmo mexendo nas sensibilidades, esta sensação não melhorou muito. É um claro lembrete que este não é bem um shooter e é mesmo importante que dominem o combate furtivo. Porque, “cara-a-cara”, podem passar um mau bocado.

Em jeito de ajuda, no menu é possível escolher uma série de opções em três áreas: Combate, exploração e puzzles. No caso do combate, é possível tornar as coisas mais fáceis, por exemplo mexendo nos danos que Lara sofre ou pode infligir aos inimigos. Não melhora propriamente o que falo acima, mas ajuda a não morrer tanto em tantas ocasiões. No caso da exploração, podemos também criar marcas mais acentuadas das zonas a escalar (com uma tinta branca). Já nos puzzles podemos obter explicações detalhadas da solução. Não achei nenhum dos puzzles propriamente desafiante para o vosso intelecto. Mesmo assim, quem quiser pode sempre obter estas orientações.

Uma das imagens de marca de toda a série são os túmulos (ou tumbas, para coincidir com a tradução). Uma vez mais, temos diversos espalhadas pelo mapa, alguns que passamos na história principal, outros que podemos descobrir explorando o mapa. Nem todos estarão disponíveis ao início, obrigando-nos a voltar atrás em algumas secções para os desvendarmos. Já no jogo anterior era assim, transmitindo alguma longevidade acrescida para os que gostam de completar o jogo a 100%. Cada uma destas tumbas é composta por diversos tipos de abordagem para encontrar tesouros, umas por conter os tais puzzles, outras apostando mais na vossa perspicácia em descobrir caminhos e até na vossa perícia na escalada ou rappel. Gostei da variedade, nunca sendo uma repetição aborrecida.

No que toca ao design, já não estamos nas montanhas geladas do último jogo. As localizações na América do Sul obrigaram a uma reformulação dos ambientes para nos trazer paisagens bem mais verdejantes. E que trabalho foi este. A Crystal Dynamics criou dois jogos deslumbrantes no plano visual. Mas, este é qualquer coisa de luxuriante. E isso fica bem patente nas imagens que temos vindo a partilhar. Entre selvas densas, escarpas quase sem fundo e sempre com imensas vistas de cortar a respiração, apesar de francamente mais sombrio, diria que este é o jogo que mais me impressionou nesta série.

Tudo tem um cuidado extremo, a começar nas expressões faciais das personagens nas cenas intermédias, passando pelo cuidado nos detalhes dos cenários e culminando com nível insano de pormenores das diversas arquitecturas. Quase nada foi deixado ao acaso. Sugiro também que no menu escolham a opção de ouvir as línguas nativas. É um pouco estranho ouvir falar em espanhol ou Quechua e Lara responder em inglês. Contudo, a visita guiada a terras tão ricas culturalmente e a diversas ruínas de civilizações perdidas, fica garantida. Se bem que, por exemplo, Cozumel não esteja bem assim na realidade… especialmente pela falta de filas de turistas nestes espaços.

Apesar do deslumbre, algumas questões técnicas assolaram a minha fase de ensaios antes do lançamento. O sincronismo de lábios nem sempre está lá e o som, por vezes, está dessincronizado com as falas. Noutros lados, acontecem muitas vezes encadeamentos de diálogos, em que várias personagens falam umas por cima das outras. Também encontrei diversos problemas com a câmara de jogo, por vezes, havendo uma pausa da acção e a câmara roda 180º do nada. Noutras vezes, os espaços confinados criam bloqueios na visão da câmara, sobretudo em movimentos finalizadores em que fica estática. Também notei algumas quebras de performance em algumas áreas, embora mais raros.

Nada disto é permanente ou estraga o jogo em si. É apenas incómodo e não acompanha a qualidade que se desvenda no ecrã. Tem de ser alvo de alguma melhoria nos próximos dias, além da actualização “Day One” lançada no dia 12 de Setembro. Considerando que este título foi concebido pela Eidos Montréal e que os anteriores foram realizados pela bem mais experiente Crystal Dynamics, havendo alguns paralelos mas muitas novidades, estes e outros pormenores podem surgir dessa passagem de testemunho. Só espero honestamente que o jogo seja mais polido nos próximos dias.

Ainda falta conteúdo a Shadow of the Tomb Raider. Depois de umas 20 horas de jogo (mais ou menos), mais umas quantas horas para explorar bem o mapa e coleccionar tudo, ainda terão mais conteúdo a chegar no futuro. Estão previstas mais adições de conteúdo, daí o passe de época disponibilizado. Notem que todos os DLC previstos, sete ao todo, incluem novas tumbas com linhas narrativas distintas, missões secundárias e diversas armas e equipamento adicional. Contudo, em nada modificam a história base ou acrescentam novas regiões. Servirão apenas de desafio para quem quiser continuar a jogar. E é assim que todos os DLC deviam ser.

Veredicto

De um modo geral, costumamos constatar que numa trilogia, o primeiro título deslumbra, o segundo costuma ser o melhor e o terceiro só perpetua a fórmula, repetindo-se. Contudo, arrisco dizer que Shadow of the Tomb Raider ainda pode ser o melhor titulo da série, quebrando essa lógica por completo. Não só pelo seu aspecto fenomenal, mas também pela sua jogabilidade expandida e riqueza de conteúdo, é uma experiência memorável com todos os ingredientes que gostamos. Contudo, tem alguns pequenos bugs que precisam ser esmagados. Ainda assim, é um final de trilogia absolutamente fantástico. A partir de agora, Lara Croft é a aventureira que aprendemos a apreciar ao longos dos anos. E isso deixa-nos entusiasmados pelo que ainda pode vir por aí.

  • ProdutoraEidos Montréal
  • EditoraSquare Enix
  • Lançamento14 de Setembro 2018
  • PlataformasPC, PS4, Xbox One
  • GéneroAcção, Aventura
?
Sem pontuação

Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.

Mais sobre a nossa pontuação
Não Gostámos
  • Diversas questões com a câmara de jogo
  • Necessidade de maior polimento técnico

Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.

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