Mais infoProdutora: Team Bondi / Rockstar GamesEditora: Rockstar GamesPlataformas: , , , Género:

Se há jogos que foram lançados adiante do seu tempo, um deles foi L.A. Noire. Na esteira de outros jogos de mundo aberto, este título originalmente criado pela Team Bondi para a Rockstar Games deixou muita gente surpresa. Seis anos depois, está de volta.

Há apenas uma única referência à Team Bondi nos primeiros minutos de jogo. O seu logótipo foi removido de quase todo o lado e apenas nos créditos iniciais e finais há a referência que este é um jogo original desta produtora. Convenhamos que esta equipa Australiana foi extinta meses depois do lançamento do jogo original, o seu primeiro e único título. Este foi um processo complicado de criação que, apesar do um sucesso tremendo, não safou a produtora da falência. Contudo, a Rockstar parece reconhecer o potencial desse esforço, fazendo agora regressar o Detective Phelps ao activo com esta reedição para a actual geração. Resta saber o que o tempo fez ao título, o que há de novo nesta reedição e, já agora, tentar discernir o porquê deste regresso.

Esta é a história de Cole Phelps, um veterano fuzileiro da Segunda Guerra Mundial que chega à mítica cidade de Los Angeles nos anos 40 como agente a Polícia local. Phelps inicia a sua carreira como agente fardado, mas cedo revela grandes capacidades na área da investigação. A sua destreza não é despercebida e acaba a ascender ao cargo de detective. Contudo, na sua senda de combater o crime, bem cedo Phelps percebe que há uma enorme conspiração à sua volta, ao ponto de envolver figuras importantes e polícias corruptos. Eventualmente, o próprio detective acaba vítima dessa conspiração e precisa provar o seu valor na linha do dever.

L.A. Noire é, como o próprio título indica, um jogo baseado nos policiais do género “film noir”, muito populares durante os anos 40 e 50. Tenta ter uma atmosfera muito próxima destes filmes, onde também ajuda a banda sonora típica deste género cinematográfico. Segundo a produção na altura do lançamento do jogo original, muitos dos crimes e eventos que vamos testemunhar são inspirados em notícias reais recolhidas dos jornais e revistas da época. A história acaba por ter a sua dose elevada de clichés e até se torna um pouco previsível. Contudo, há lugar para algumas reviravoltas interessantes no enredo, assim com um bom desenlace das nossas acções para a conclusão final.

Obviamente, o objectivo desta análise não é falar do original de 2011, mas sim esta reedição remasterizada que inclui também todos os DLCs e actualizações posteriores lançados entretanto. Abreviadamente, este é um jogo de investigação policial com elementos de condução em mundo aberto, um pouco derivados de Gran Theft Auto (do outro lado da Lei, obviamente), com algum tiroteio e perseguições a pé (menos frequentes) e com investigação de crimes com especial destaque à entrevista de testemunhas. O desafio que este título tentou ultrapassar foi o de permitir aos jogadores analisar linguagem corporal nessas entrevistas e decidir se o entrevistado está a dizer a verdade ou mentir, permitindo angariar respostas e até confissões. Como o fazer se os motores gráficos, nem mesmo hoje, estão assim tão aprimorados para transmitir emoções humanas credíveis?

Na altura, a produção optou por usar uma tecnologia de captura de imagem bastante avançada chamada de MotionScan. Basicamente as faces dos actores foram captadas na sua performance por 32 câmaras que abordavam todos os possíveis ângulos, formando uma imagem digital tridimensional. Ou seja, ao invés de criar uma personagem 3D animada por captura de movimentos, é a própria face dos actores que é reproduzida em três dimensões. Isto permite uma profundidade de emoções e detalhes sem precedentes e que nenhum outro jogo até hoje conseguiu realmente superar, com mais ou menos qualidade nas representações de personagens em jogos recentes.

Ao decidir trazer de volta este jogo ao fim de tanto tempo para a PS4, XB1 e Switch (além de uma versão VR para o PC), a Rockstar também parece querer provar como este jogo ainda possui uma qualidade assinalável, fruto dessa tecnologia tão avançada para o seu tempo. Os desafios de trazer um jogo de 2011 capaz de correr em resoluções 4K e com recurso a dispositivos de realidade virtual, porém, lembram-nos frequentemente da sua antiguidade. Embora as faces das personagens continuem francamente credíveis, os seus corpos e algumas animações notam alguma “idade”. Também o ambiente geral ao nível de texturas e iluminação não é o que esperam de jogos recentes, mesmo que esta reedição traga algumas texturas e efeitos revistos.

Contudo, onde o jogo mais se ressente é mesmo na sua jogabilidade. Toda a componente de investigação está exactamente igual, baseando-se na busca de pistas pelos locais de crime ou áreas de interesse. Também os interrogatórios são praticamente idênticos, excepto no facto da Rockstar ter decidido trocado o título das opções de interacção de “verdade”, “dúvida” e “mentira” para “bom polícia”, “mau polícia” e “acusação”. Penso que a ideia é ajudar a diferenciar melhor a interacção, mas parece um pouco mais confuso que o original. O pior é quando o jogo nos dá o volante ou a pistola para a mão. Já muito foi feito depois de 2011 neste campo e é notório que essa componente também merecia uma remasterização. São secções inócuas, pouco realistas e com algumas questões que podiam ser melhoradas.

Então, se o jogo é virtualmente idêntico ao original, mantendo até as suas limitações, porque foi reeditado? Além da óbvia capacidade de hardware das consolas actuais, do aproveitamento das novas plataformas como a portabilidade da Switch e das capacidades do 4K e VR, é difícil ver alguma motivação por parte da Rockstar para relançar este jogo. Será porque necessitavam de renovar a sua propriedade intelectual, talvez com uma sequela na forja? Será porque queriam erradicar, de uma vez por todas, a sua ligação com a Team Bondi? Talvez nunca venhamos a saber ao certo. Motivações financeiras parecem um pouco remotas, sabendo que esta produtora tem em GTA um dos títulos mais rentáveis de sempre nesta indústria.

Tenho de dar destaque à versão para a Nintendo Switch. Parece-me também um lançamento estranho. Tudo bem, podemos levar o jogo para qualquer lado e até usar os sensores de movimento dos controladores para analisar itens de investigação, mas é praticamente tudo o que tira proveito desta consola. Digamos que o limitado hardware da consola é suficiente para esta remasterização, mesmo que não atinja a resolução 4K ou aproveite algumas das texturas melhoradas e efeitos visuais que vimos na versão para a PS4. Ah! E precisam de um cartão MicroSD, uma vez que o jogo não tem espaço suficiente para se instalar na memória interna. Depois do recente DOOM, este parece ser o segundo jogo menos provável na consola familiar da Big-N. Crime, corrupção, estupefacientes e outros temas adultos não parecem fazer parte do espectro temático desta consola. Contudo, é notório o interesse da Nintendo em tornar a sua consola mais apetecível aos jogadores mais sérios.

Ao fim destes anos, pessoalmente, esta é a quarta vez que passo o jogo na sua inteireza. Analisei-o na velhinha PlayStation 3 aquando do seu lançamento, depois tive oportunidade de o jogar novamente no PC e voltei a essa mesma versão quando obtive os DLCs que foram lançados posteriormente. Com esta nova versão pude concluir umas quantas coisas que só é possível observar ao fim de tantas horas de jogo. Uma delas é a mais óbvia para os amantes do cinema clássico. Este jogo não é assim tão “noir” como tenta transparecer. Apesar dos temas serem comuns, falta-lhe aquele roçar moralista em temas um pouco mais profundos. Também não tem a cinematografia obscura, geralmente a preto-e-branco que seria de esperar. Há alguma vontade de lá chegar, mas é comedida.

Também já falei dos seus momentos menos bem conseguidos de interacção e da “idade” de algumas animações e modelos. E isso fica evidente também no seu mundo aberto que, apesar de impressionante no seu rigor histórico, é um pouco desprovido de interesse. Só vale a pena pelo nosso desejo de explorar Los Angeles nos anos 40, em particular com os veículos típicos dessa era. Seria óptimo ter algo mais para interagir nesta recriação, além da condução de A para B e ocasionais perseguições. Até porque, como já disse, na PlayStation 4 e na Xbox One houve algum trabalho de melhoria de texturas e de efeitos visuais, inclusive na meteorologia, que tentam dar uma nova vida ao ambiente de jogo. Oportunidade perdida.

Veredicto

Esta nova vida para L.A. Noire é um excelente pretexto para regressar a um dos melhores jogos policiais que jamais foi criado. A sua tecnologia de captura das faces dos actores ainda impressiona, embora fique meio ofuscada pela antiguidade geral das animações e modelos. As novas plataformas dão-lhe um aspecto mais actualizado, mesmo assim, com a Nintendo Switch a dar também alguma imersão na interacção com os sensores de movimento dos Joycon. De um modo geral, quererão jogá-lo pelo seu argumento adulto e intrincado, numa história sombria e que só não é melhor porque, ironicamente, foge um pouco ao tema do seu título. Só gostava que a Rockstar aproveitasse a remasterização para rever a sua jogabilidade. Talvez um L.A. Noire 2? Torçamos por isso.

Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.