Forspoken (1)

Análise – Forspoken

Nos últimos tempos, muita gente se predispôs a dissertar sobre o insucesso de alguns jogos recentes da Square Enix. Seria de esperar que Forspoken fosse um argumento de redenção para a produtora e editora Nipónica.

Cabe à produtora Japonesa Luminous Productions, uma sua subsidiária este importante papel de criar um novo IP para a Square. Há uma clara estratégia ponderada na produção dos jogos assinados pela SE, todos criados a pensar em aventuras épicas de enorme escala. Entre as várias tentativas da SE de apelar a novas audiências, ao apostar em novos IPs e até de se “ocidentalizar”, Forspoken é um jogo que resume em si a muita ambição da empresa em criar um “blockbuster”. Só que há uma clara falta de identidade própria que, aliada a questões de conceito e de ordem técnica, fazem deste mais um jogo “agridoce”. Já explico.

Frey Holland vive uma vida triste, baseada num passado igualmente triste. Abandonada à nascença num túnel, o Holland Tunnel que lhe dá o nome, a orfã vive nos meandros do crime organizado na cidade de Nova Iorque. Quando a conhecemos, percebemos que tem problemas com a justiça e também com os meliantes que exploram a sua vulnerabilidade. Quando tudo parecia encaminhado para finalmente fugir desta vida fútil, acontece o impensável: um incêndio destroi a “sua” humilde casa e também todo o dinheiro que tinha juntado para a viagem com o seu gato Homer.

No rescaldo dessa desgraça, depois de deixar o gato ao cuidado da única pessoa que pareceu interessar-se pela protagonista, Frey está frustrada. Mas, um último acto impensado é travado pelo que parece ser um “toque” de magia. Ali perto, algo chama a sua atenção, um objecto de aspecto valioso, abandonado. Ao pegar no que parece ser uma elaborada pulseira de ouro, subitamente é teleportada para um mundo estranho que parece estar ameaçado com algo inexplicável. E, pior, a tal pulseira começa a falar.

A história de Frey é, claramente, uma de redenção e busca pelo significado da sua existência. O novo mundo, Athia, serve de catalisador e palco da sua transformação em algo maior. De certa forma, é uma alegoria, onde a heroína irá perceber que, afinal, o seu papel é bem mais importante que imaginava e possui em si um poder que pode ser usado para resolver os problemas dos dois mundos, os de Athia e o seu próprio mundo em Nova Iorque. E o seu passado também tem outro significado quando percebe os motivos de ter sido “abandonada” naquele túnel.

Não tenho nada contra a história contada neste enredo ou contra as personagens, por mais estereotipadas que sejam. A relação de Frey com Cuff (a pulseira) até funciona na maior parte do tempo, mesmo com a forçada linguagem vulgar que Frey resolve manter. O que não cativa mesmo é o casting de actores. Infelizmente, quem devia realmente transmitir a emoção certa, a cadência e a química entre si é quem realmente falha. Cenas intermédias que misturam más prestações vocais com animações exageradas e claramente inspiradas em captura de movimentos de actores Japoneses, simplesmente não funcionam bem.

É preciso notar que a história pretende ser o ponto fulcral da acção jogo. Há uma evolução de eventos que só começa mesmo depois do segundo capítulo e que realmente tem bons ingredientes para nos cativar. Também o desfecho da história é positivo, no sentido em que, realmente, assistimos a uma metamorfose da protagonista, exactamente a busca de identidade que tanto precisava. Não há muitas surpresas, confesso, já que quase tudo é “transparente” o suficiente para prevermos onde irá parar. Mas conta uma boa história. Por isso, a prestação dos actores devia ser bem melhor.

Até porque o restante da oferta não é assim tão brilhante como esperado. Como devem imaginar, a tal pulseira confere a Frey umas habilidades interessantes. Entre movimentos de parkour aumentados por golpes de magia e vários feitiços de diferentes ataques e defesas, a fórmula pretendida parece realmente interessante. E tem uma boa margem para melhorar, graças à árvore de evolução onde vamos desbloqueando mais e melhores feitiços. A ideia é usarmos os novos poderes para ajudar a libertar Athia de vários perigos e inimigos, enquanto a desvendamos a trama.

O jogo bem que nos prepara para acção, com um primeiro acto sem poderes, que serve bem para demonstrar quão impotente pode Frey ser, apesar das suas tentativas. Depois, começa a “abrir” para uma super-heroína com poderes incríveis e que realmente pode fazer a diferença. Não perde tempo com muitas explicações, levando-nos logo para um enorme combate com um boss gigante, só para “abrir a pestana”. Arrojado, colorido, por vezes frenético, sempre com bom espírito, o primeiro impacto com a jogabilidade de Forspoken é cativante e promissor.

Mas, no final deste primeiro encontro, praticamente acabaram de experimentar tudo o que o jogo tem para oferecer. Tirando alguns poderes mais interessantes que vão sendo introduzidos lentamente a cada novo nível, a lógica é sempre a mesma. Este jogo mais não é que um “shooter”, em que a pulseira dispara projécteis e explosivos mágicos. As habilidades variam e são seleccionáveis mas, boa sorte a escolhê-las com um menu francamente mal desenhado e lento, que não melhora com a evolução.

Aliás, esta interacção não está muito bem pensada. O comando (gamepad) é claramente a plataforma para onde o jogo foi concebido. Mesmo assim, o “flow” entre gatilhos e botões não é muito intuitivo. No teclado e rato, as coisas melhoram um pouco mas também aqui tive de remapear algumas funções. Gostava que o poder de escudo, por exemplo, estivesse mapeado para uma tecla de defesa, mas é um poder que tem de ser escolhido no tal menu confuso. Estou certo que é uma questão de hábito mas já temos convenções modernas nos controlos, para quê inventar?

Por outro lado, não temos concretamente um elemento estratégico nos combates. Talvez apenas no boss final onde é preciso, de facto, ter algum planeamento e destreza. Na maioria dos casos, sejam inimigos avulsos ou grandes monstros, tudo se resume a disparar, disparar e disparar mais um pouco, preferencialmente contra as suas partes vulneráveis e com as armas certas. Quando descobrem o ritmo, notarão que o jogo é francamente fácil e que o desafio é só proporcional à vossa paciência em dosear ataques com defesas e aguardar que o inimigo finalmente fique sem energia.

Poderão dizer: “não são assim todos os jogos de acção neste género de aventura com elementos RPG?” Sim, não há dúvida que a Luminous foi buscar inspiração em diversos jogos semelhantes. Podia enumerar vários, todos eles de elevada qualidade. Os poderes de Frey fazem-me lembrar os de Jesse em Control. Os monstros gigantes possuem uma “vibe” que me recorda a série Monster Hunter. A exploração dos mapas é claramente algo que já vimos também em vários jogos de aventura. Mas não consigo extrair deste título algo que se torne único ou memorável.

Talvez destaque o tal movimento parkour doseado com magia que, de facto, é para mim o seu elemento mais interessante. Percorrer os mapas assim é divertido, correndo impossivelmente rápido, escalando muros e até voando sobre obstáculos, num free-flow muito bem conseguido. Tudo é ampliado pela magia de Frey, criando momentos espectaculares. E isto incentiva bastante a explorar os mapas em busca de segredos, recursos de crafting para melhoria do equipamento e habilidades. É dos poucos jogos recentes que sabe muito bem preencher o nosso tempo entre combates e cenas intermédias com algo gratificante.

Antes desta análise propriamente dita, dei uns passeios por Athia na demonstração que esteve disponível na PlayStation 5. Na altura, achei que o jogo demonstrava já algumas variâncias estranhas na qualidade, com óptimos pormenores misturados com falhas de modelação, texturas ou animações. Faces com imenso detalhe, mas expressões ocas, ou sincronismo de lábios falível, por exemplo. Ou ainda, cenários luxuriantes que ao perto perdem toda a sua beleza com texturas e detalhe pobres. Tudo me pareceu fruto de uma optimização feita a pressa para esta demo.

Contudo, quando finalmente peguei na versão de análise no PC, continuei desapontado. Com um nível de hardware recomendado tão alto, dizer que a versão PC é exigente, é um eufemismo. Contudo, mesmo com hardware acima do recomendado, não há justificação para a falta de optimização latente que tive nas penosas primeiras horas a jogar. Um constante “borrão” na definição de modelos e texturas, quebras de fps incrivelmente altas, falhas de carregamento de texturas que aparecem “gradualmente”, erros nas animações, um exagero do uso de memória RAM…

A sério que as reticências acima são necessárias. Há muito mais elementos negativos que prefiro nem assinalar neste notório “port” das consolas para PC. Este é só mais um jogo mal concebido para PC, num péssimo historial de versões falíveis no PC de jogos da Square Enix. Perdi largos minutos a tentar optimizar as coisas, ligando e desligando itens para tentar, de alguma forma, arranjar um compromisso entre qualidade e performance. Não consegui totalmente esse feito, mas permitiu-me jogar até ao final. Actualizações são urgentes para optimizar este jogo.

Veredicto

Ironicamente, a história de Forspoken é francamente paralela ao seu próprio conceito. Tal como a protagonista, este é um jogo com óptimo potencial, estragado por decisões falíveis ou, simplesmente, pouco trabalhadas. A versão PC analisada não é a sua melhor representação, mas o jogo apresenta falhas também em conceito, com poucos elementos de redenção. Navegar por Athia a fazer parkour e a disparar magia contra inimigos, enquanto uma pulseira nos dá conselhos de vida, soa muito bem. Mas, talvez o “muro” que se quis “transpor” fosse um pouco alto demais.

  • ProdutoraLuminous Productions
  • EditoraSquare Enix
  • Lançamento24 de Janeiro 2023
  • PlataformasPC, PS5
  • GéneroAventura, Role Playing Game
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Sem pontuação

Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.

Mais sobre a nossa pontuação
Não Gostámos
  • Incrivelmente fraca optimização no PC
  • Combate pouco evolutivo
  • Casting de vozes
  • Algo repetitivo

Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.

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