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Análise – Dune: Spice Wars (Acesso Antecipado)

A nova aposta da Funcom levou-me a uma viagem ao passado. Dos primeiro jogos de estratégia que me lembro de jogar, foram mesmo baseados na célebre história de Frank Herbert. Só que Dune: Spice Wars pertence a outra época na história dos videojogos.

O meu primeiro contacto com os famosos jogos de Dune, aconteceu com Dune II: Battle for Arrakis, desenvolvido em 1992 pelos idos Westwood Studios, os mesmos por detrás do não menos famoso Command & Conquer. Exactamente por isso, as semelhanças entre os dois títulos são muitas, com C&C de 1995 a herdar imensas ideias que Dune II tinha introduzido. E é impossível não identificar outras tantas semelhanças no ainda mais famoso Age of Empires que chegou em 1997. A influência nos jogos de estratégia por parte dos RTS de Dune é, portanto, longa. Ouvir que regressa agora num novo título foi uma óptima notícia.

Mas, como já dei a entender, os tempos são outros para o género RTS (Real Time Strategy ou Estratégia em Tempo Real). Embora a fórmula icónica dos jogos clássicos baseados em Dune II ainda esteja por aí, outros tantos títulos de estratégia introduziram uma nova jogabilidade, intitulada de “4X”. Esta é uma abreviatura de “Explore, Expand, Exploit, Exterminate” ou “Explorar, Expandir, Tirar Partido e Exterminar”, numa tradução muito livre. E o que faz é tentar reformular a forma como os RTS são jogados.

Nos jogos clássicos, para ganharmos uma sessão teríamos de simplesmente ter mais recursos e o maior exército para conquistar ou destruir os opositores. Por mais que achem que é uma lógica simplista, foi com isto que crescemos e levou milhões a apreciar o género RTS. Ao longo dos anos, o modelo foi sofrendo várias mutações, com títulos cada vez menos virados para os combates massivos ou, pelo contrário, ainda mais focados nesse aspecto. O género 4X, por seu lado, uma mistura de vários mundos, foi ganhando tracção, tornando-se hoje em dia dominador.

O que este género faz é criar uma menor dependência do combate directo, sendo apenas um quarto da sua acção. A exploração de recursos, a expansão de território, mas também a influência política e a espionagem (os jogos de bastidores, portanto), ganham muito maior protagonismo. O que resulta em jogos bem menos dependentes do maior exército, mas sim do maior engenho para lidar nas quatro frentes. Confesso que é, para mim, um género menor, já que prefiro mais acção directa que diplomacia.

Esta nova visão do que é um jogo de estratégia de Dune, portanto, pode dividir bastante a base de fãs. Por um lado, temos os veteranos nostálgicos que se apressarão a reinstalar os clássicos (boa sorte), por outro, temos os fãs dos 4X modernos que adorarão a nova história para explorar. Até porque tivemos recentemente o filme de Denis Villeneuve que veio reacender o interesse na famosa história criada por Frank Herbert. Preferências pessoais à parte, por mais que custe admitir, a aposta na nova audiência é claramente a mais acertada.

Como não podia deixar de ser, Dune: Spice Wars gira em torno da eterna batalha das principais casas pelo domínio de Arrakis, o famoso planeta com a alcunha de “Dune”. O que tem este famoso planeta desértico de tão apetecível? Já devem saber que é a especiaria Melange que está no centro de tudo. Fonte de dinheiro para uns, vício para outros, quem controlar a “spice” controla tudo em Arrakis. É por isso que a casa Atreides e Harkonnen lutam pelo seu controlo, enquanto que os bandidos (Smugglers) e os nativos Fremen lutam para as travar.

Não há um grande desenvolvimento narrativo nesta história. Na verdade, a obra de Frank Herbert serve apenas como base para os eventos em jogo. Tudo o que se passar na campanha que escolham iniciar, por cada uma das quatro facções, é fruto do vosso investimento. Quem é que vai conquistar Arrakis? É convosco. A história de Paul Atreides fica de fora desta narrativa, o Muad’Dib, portanto, somos nós, para o bem e para o mal de Arrakis. Isto, porque tanto podemos ser um libertador do planeta, como podemos ser um opressor tirânico, ávido por constituir um império.

A produtora Shiro Games é bastante experiente neste género e é óbvio que teve muito por onde se inspirar. O género RTS 4X amadureceu em conceito e ideias, que este jogo habilmente implementa, sem realmente “reinventar” nada. O seu título anterior Northgard, aliás, empresta muitos elementos a este novo jogo, não sendo propriamente uma “repetição”, mas… vá lá… uma “inspiração”. Da arte “desenhada” ao aspecto geral das unidades, dos mapas e até dos menus, notarão muitas semelhanças com o título nórdico da produtora.

Mas, este é um jogo de Dune. Como tal, é preciso honrar a imagem e os conceitos de Herbert, “piscando o olho” aos clássicos que “abriram caminho”, sem esquecer o filme recente. É por isso que as unidades Harkonnen possuem a cor vermelha e Atreides a cor verde, por exemplo. Mas, também temos aqui os Ornithopters que vimos no filme. Aliás, as personagens possuem um design muito próximo da representação no grande ecrã, mesmo que tentem fugir um pouco no aspecto final.

Como qualquer outro 4X, começamos pela implementação e expansão da nossa base de operações. Ao mesmo tempo, as três outras facções farão o mesmo. A ideia é conseguir cobrir todo o planeta com a nossa influência, por explorar a especiaria e por agir politica e militarmente. Para efeitos de análise e para que consigam acompanhar melhor esta minha viagem por Arrakis, vamos partir do princípio que escolhem a casa Atreides, tal como Herbert (provavelmente) gostaria que fizessem, já que a história original gira em torno desta facção.

Começamos o jogo na nossa famosa cidade-fortaleza de Arrakeen. O nosso território resume-se a uma célula no mapa, sem grandes recursos. Mandamos o Ornithopter explorar o mapa “nublado” e cedo este veículo explorador começa a revelar cidades e recursos, com especial destaque para os míticos campos de Melange para extrair essa valiosa especiaria. A casa Atreides possui uma habilidade única de anexar cidades pacificamente, mantendo os defensores originais. Pelo que a nossa expansão é francamente pacífica no início.

A ideia é ir construindo infraestruturas e dependências para criar uma indústria que gira em torno de várias frentes. Num lado, temos a extracção de Melange que é o foco principal da nossa actividade. Temos de criar refinarias que, por sua vez, gerem as enormes máquinas extractoras. Temos de as defender de ataques de bandidos, mas também do mítico “sandworm” que é atraído pelas vibrações das máquinas. Se a especiaria fluir, fazemos dinheiro e, claro, pagamos ao império o devido imposto.

Noutros lados, temos um medidor de influência e de recursos. A água é um importante recurso que obriga a sérios investimentos, por exemplo. Não basta expandir território e anexar cidades. É preciso garantir que há dinheiro para manter estruturas, que temos a necessária influência, que temos os materiais para construir e água para suprir. A guerra é o último detalhe em que nos vamos concentrar. Até porque, muito possivelmente, demorará até que a vossa economia esteja estável para pensar em atacar os demais territórios ocupados.

Contudo, a dado momento as coisas complicam. Como já disse, as demais facções estão a fazer exactamente o mesmo que nós e, eventualmente, começam as guerras diplomáticas. Para isso temos votações de novas leis, espionagem e até acordos diplomáticos que tanto podem ser vantajosos, como francamente inúteis. Isto, porque muitos dos nossos contactos com as facções são, quase sempre, numa base de interesses. E é óbvio que ninguém quer ceder mais do que está disposto a perder.

Inevitavelmente, entraremos em conflito aberto. Para isso, geramos grupos de combate, entre soldados de ataque próximo, de combate à distância, sabotadores e até drones. Não há aqui uma aposta em unidades militares mais robustas. As que temos servem apenas para defender as nossas unidades ou atacar quem ousar desafiar-nos. Não podemos deambular com elas pelo deserto, sob pena de morrerem a meio caminho. Não podemos formar grandes exércitos porque se tornam caros de criar e manter (além de estarem limitados às infraestruturas militares que erguemos).

Aliás, apostar somente no aspecto bélico não é, de todo, possível. Leis e reformas aprovadas podem começar a criar custos insuportáveis, especialmente se começarmos a formar grandes exércitos com que as outras facções se sintam ameaçadas. Por outro lado, sem exércitos seremos uma presa fácil dessas facções. É tudo uma questão de equilíbrio, portanto. Sabendo sempre que nos bastidores podemos gerar muitos mais danos que a atacar directamente uma cidade opositora.

Para mim o elemento mais aleatório do jogo é mesmo a sua economia. Parece que a produção quis simplesmente anular qualquer tipo de facilitismo. Nenhuma frente em particular é vantajosa só por si. Podem sempre apostar em comprar e vender recursos, lidar com as negociações do chamado Choam e até diminuir custos de construção e defesa. Mas, subitamente, o Império decide cobrar uma percentagem maior de Melange que, se não tivermos stock disponível, incorre numa perda de influência política, destruindo a nossa posição.

Sobreviver neste jogo envolve imensa micro-gestão e ainda mais paciência. É muito tentador olharmos para o mapa explorado e pensarmos que podemos conquistar tudo. Contudo, há um equilíbrio entre as facções que torna isto difícil. Os bandidos preferem ataques constantes em pequena escala, os Harkonnen preferem os jogos políticos e expansão coerciva. Na minha passagem pelo jogo, dei por mim a fazer uma expansão lenta, pejada de muitos avanços e recuos.

E é aqui que os veteranos dos RTS de Dune terão mais dificuldades. Provavelmente terão saudades dos conflitos lineares, das fronteiras fixas, sabendo de onde vêm os ataques. Os conflitos aqui são algo aleatórios na sua origem, nunca sabemos bem se a guerra surge das armas ou das sanções. Por exemplo, para construir refinarias, fábricas ou dependências, temos de anexar cidades, por isso as suas revoltas para se tornarem independentes são dos golpes mais complexos de gerir, perdendo tudo o que ali investimos. Este e outros elementos criam momentos imprevisíveis que podem criar uma espiral descontrolada de caos.

E não pensem que alguma das casas torna a jogabilidade mais fácil ou mais difícil. Cada uma tem prós e contras para lidar e entre as quatro há habilidades que se anulam ou contrapõem, sem dar grande vantagem a ninguém em particular. Por isso, é preciso ter muita, mesmo muita calma e olho atento, independentemente da facção. Infiltrar agentes noutras casas e esferas de influência, sabotar, chantangear, executar missões furtivas, negociar acordos, é isto que fará a diferença neste neste jogo. E isto envolve muitas horas de estudo e estratégia para atingir o nível máximo de Hegemonia e o controlo social, político e militar de Arrakis.

Por fim, o aspecto técnico. Confirme disse acima, há imensos elementos visuais que são emprestados do conceito gerado em Northgard. Não temos cenas intermédias propriamente ditas, mas a arte e animações das personagens são algo semelhantes, obviamente com o toque decorativo necessário do universo de Dune. Em termos de interacção e jogabilidade, é o que esperam de um RTS 4X, com muitos menus e quadros para ler. Tecnicamente, neste acesso antecipado que tive, encontrei poucos bugs e erros, tudo facilmente mitigado com actualizações.

Veredicto

Este é um regresso muito esperado de um universo fantástico, num tipo de jogo que nos faz recuar no tempo. Contudo, Dune: Spice Wars é… “outra especiaria”. Trata-se de uma nova abordagem 4X que pode não ser do agrado dos que jogaram os RTS clássicos. A sua amplitude de jogabilidade, cria um título complexo, um tanto denso demais para quem prefere algo mais virado para a acção. Este é, contudo, um dos melhores jogos de estratégia 4X que encontrarão por aí, ainda por cima no universo Dune que está tão “na moda”.

  • ProdutoraShiro Games
  • EditoraFuncom
  • Lançamento26 de Abril 2022
  • PlataformasPC
  • GéneroEstratégia
?
Sem pontuação

Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.

Mais sobre a nossa pontuação
Não Gostámos
  • Género 4X não será do agrado de todos
  • Algo denso para dominar

Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.

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