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Análise: DOOM

Nos idos anos 90, um jogo ditou um género. Sim, já tínhamos Wolfenstein 3D, mas o título que levou a Id Software à ribalta e definiu o que é o género de acção na primeira pessoa foi mesmo DOOM. Quase 23 anos depois, eis um convite para irmos ao inferno… outra vez.

Tantas dúvidas me assolaram durante os primeiros minutos em que peguei neste reboot. Aqui estava o regresso de um dos jogos de acção na primeira pessoa que mais me agarrou ao ecrã, mas também mais me frustrou pela sua injustificável dificuldade. Já passaram tantos anos desde que o primeiro me ocupou por madrugadas adentro, que dificilmente terei um impacto tão profundo. Afinal, DOOM foi um dos primeiros jogos do seu género, definiu-o na realidade. O peso sobre os ombros da Id Software, sem os criativos Carmack e Romero, partilhado agora com a experiente Bethesda, é de assinalar. E o maior crítico de todos, o que pode ditar se o jogo merece ou não carregar esse legado, é o jogador que perdeu inúmeras horas à frente do 486 em 1993 e que pode agora regressar.

Sejamos claros, este DOOM jamais terá o mesmo impacto do original de 1993. Envolto em polémica desde o primeiro dia graças à extrema violência gratuita e temas controversos, chegou até a ser associado ao comportamento dos assassinos do célebre “Massacre de Columbine”. Hoje em dia, há muitos outros títulos a apostar no gore, na violência desmiolada e no oculto. Já pouco se pode fazer para impressionar nesse sentido. No entanto, os tempos são outros e a produção já não procura irreverência. Procura um jogo sólido e que nos convide a jogar. Este novo DOOM só pode apostar noutra vertente que faz parte do ADN do original: A sua jogabilidade brutal e crua, repleta de desafio e com o claro interesse de entreter.

Aqui, já tivemos um primeiro contacto na nossa Antevisão. Ainda um pouco longe do jogo final que agora temos em mãos, estava, mesmo assim, delineada toda uma acção veloz e igualmente visceral. Só que essa era a jogabilidade do online que já irei falar. Muito antes de haver modos de multi-jogador, DOOM era jogado numa frenética campanha a solo, por vezes, absurdamente difícil, onde até esquecíamos o quão repetitiva podia ser… de tantas vezes que morríamos e reiniciávamos o mapa.

E nem interroguem sobre o enredo. É simples e directo: uma base da UAC (Union Aerospace Corporation) em Marte está a ser atacada por demónios depois de uma experiência ter corrido mal. Lá, um Space Marine (que chamamos de Doomguy e que controlamos) terá de combater para libertar a base da ameaça demoníaca. O que se segue é uma epopeia de balas, explosões e imenso sangue que terminará algures numa batalha infernal para sobreviver. Há algumas cenas intermédias que tentam enquadrar a trama, mas o que interessa é progredir para matar adversários cada vez mais artilhados. E é só isso que preciso saber, deem-me a caçadeira, por favor!

Mas, ao início, só estamos armados com uma mísera pistola. Felizmente, nessa altura o jogo introduz-nos a uma nova mecânica que é tão importante como viciante: a Glory Kill. Basicamente, é uma finalização ridiculamente gráfica (leia-se “brutal”) de um adversário que está atordoado com baixa energia. E vão querer fazer muitas Glory Kills, uma vez que é uma das formas de recuperar energia, além dos powerups do jogo. E, sim, fiel ao original a energia não se regenera por si e é preciso procurar formas de a recuperar, assim como o escudo e munições das armas. Aqui não existem as facilidades das mecânicas de outros títulos modernos. Bom… a pistola tem munição infinita… mas só isso, ok?

E não pensem que vão correr como desalmados, trepar paredes ou obter cobertura atrás de caixotes. O nosso Space Marine não corre, tem uma passada larga que é suficientemente rápida, não tem jetpacks, não faz piruetas, nem possui truques de magia. A lei é a da bala e da execução, podem saltar e agachar, mas não terão manobras tipo “parkour“. Podem e devem usar o cenário para procurar cobertura, mas apenas de forma temporária, até porque os inimigos são aos magotes e gostam de nos rodear. Como na “velha-guarda”, só quando todos eles são eliminados é que podemos progredir nas áreas, por isso, aquela estratégia de tentar avançar furtivamente também vai correr mal. E também não devem ficar imobilizados a disparar, uma vez que serão literalmente envolvidos pelas hordas de demónios.

E que hordas. Tal como no jogo original, vamos ter contacto com inimigos relativamente simples ao início, mas que vão lentamente tomando formas e feitios cada vez mais grotescos… e letais. As fileiras infernais são compostas por monstros que vão desde os simples humanos possuídos a demónios gigantescos e desafiantes. Vamos enfrentá-los em vagas ou em arenas gigantes. Alguns, como os lendários “imps” ou os irritantes demónios cor-de-rosa (carinhosamente chamados de “pinkies“), carregam na nossa direcção, outros preferem manter uma passada lenta, mas disparam armas poderosas. Há que escolher a melhor arma do nosso arsenal para lidar com as ameaças e nunca parar de movimentar e disparar.

Algum tempo no jogo e já terão uma boa escolha de armas disponíveis. Andei alguns minutos desesperado pela mítica caçadeira de cano duplo que só vai aparecer lá mais para a frente. Até lá, fui tomando conhecimento de que existe outras armas interessantes, como uma espingarda de assalto, uma metralhadora de energia, um canhão Gauss e até um lança-foguetes incrivelmente desapontante. Contudo, a caçadeira de canos serrados é o ícone do jogo, sempre foi. Todas as armas possuem uma característica única, entre fogo automático que torna mais fácil atordoar adversário para efectuar a tal Glory Kill, ou uma granada que suga energia dos adversários, por exemplo. Mas a caçadeira desmembra os inimigos, muitas vezes com um só tiro. Que outra arma quereriam usar?

E quando as armas convencionais não chegarem, sempre temos a lendária BFG 9000. Este canhão de plasma é capaz de limpar uma sala inteira com um só tiro. É muito recompensador andar a tentar reunir adversários em grupos largos e aguardar que a arma carregue para liberta a explosão verde que os elimina quase instantaneamente. E se quiserem algo ainda mais recompensador, não se esqueçam de apanhar combustível para a vossa moto-serra. Além de matar instantaneamente e de forma ridiculamente fácil os inimigos, é capaz de ser a arma que mais usei para sair de situações mais complicadas, completamente rodeado ou sem munições.

Armas dominadas, todas as arenas e salas por onde passamos só nos preparam para as lendárias lutas com bosses. Cada boss possui uma característica única que obriga a uma estratégia. Aqui já não conta tanto a destreza com a armas, mas o cronometrar de ataques e a previsão de movimentos. Há quem goste desta mecânica, mas também há quem prefira combates mais directos. Pessoalmente, considero que todo o jogo é directo e linear demais e que estas fases desafiantes são boas alternativas à acção. Até porque, algures, vão sentir que já fizeram o mesmo durante vastas horas e por vários mapas. Tal como o original, a repetição é inevitável.

Nem tudo é “velha-guarda”, porém. Há agora um esquema de progressão para armas e equipamento, permitindo evoluir a personagem em energia, protecção e danos. Evoluam, porque vão precisar dos modificadores para desafios maiores mais à frente na carreira.  Explorem os mapas, sobretudo percorrendo os caminhos menos óbvios e vão encontrar áreas secretas onde podem encontrar tokens para upgrades. Há também Runas para apanhar cumprindo desafios rápidos em salas especiais. Uma nota interessante é que estão também escondidas secções inteiras decoradas com o aspecto gráfico dos níveis originais de DOOM. São presentes nostálgicos, com as mesmas texturas e objectos clássicos de 1993. Boa homenagem!

E se também compararmos com o jogo original, há uma outra novidade de igual importância: O modo multi-jogador. Há quem diga que é dispensável, mas hoje em dia poucos são os jogos de acção na primeira pessoa que não possuem esta componente. E com tantos pontos positivos na acção deste DOOM, seria um desperdício não aproveitá-los e colocar o excelente design de níveis e acção visceral num modo online.

Só que, no online o jogo assume-se como algo diferente. Já ouvi dizer que este é um novo Quake, e há alguma razão nesta afirmação. Esse outro jogo da Id Software com imensas evoluções, empresta muita coisa ao online deste título. A começar na passada rápida, passando pelo convite aos constantes saltos, a nostalgia bateu forte nos primeiros minutos online, mesmo na antevisão que fiz e nem sempre pelas melhores razões.

Sim, gosto de jogos com velocidade e é desafiante ter a dinâmica de energia não recuperável, com powerups à mistura. Mas as armas já não são apanhadas do mapa, desconsiderando o desnível importante que pode resolver momentos de jogo. Como disse na antevisão, todos os jogadores arrancam com as mesmas armas disponíveis, algumas como o lança-foguetes são abusadas, sobretudo pelos mais recentes. Há constantes chuvas de granadas e foguetes, com muito saltos e portais de teleporte à mistura.

Uma forma de desnivelar um pouco a acção é com uma novidade herdada de outros jogos modernos. Os importantes modificadores chamados de Hack Modules permitem activar bónus em jogo de forma temporária. Desde visionar os inimigos através das paredes, ou multiplicar danos, são bónus que só podem ser usados uma única vez e de forma temporizada. Conjuntamente com alguns bónus no mapa (Berserk e Quad-Damage são os mais desejados), estes módulos podem ditar a derrota ou a vitória e precisam ser usados de forma estratégica. A forma aleatória com que são ganhos, porém, fazem deles algo acessórios, mesmo sejam importantes.

Já devem saber que lá pelo meio há uma Runa especial para invocar um demónio de quatro que podemos desbloquear com a evolução e escolher. É basicamente um ser ridiculamente forte que “possuímos” e espalhamos o caos pelo mapa de forma quase invencível. Pode parecer injusto, mas é temporizado e uma equipa que esteja a perder pode dar a volta ao resultado. Apanha a Runa o primeiro a chegar, por isso, convém que seja a nossa equipa.

Também podemos marcar a diferença de outra maneira, graças à personalização visual de armaduras e armas. De facto, foi um destaque na nossa antevisão o nível quase demente com que podemos criar padrões e colorir o nosso equipamento, dando desgaste, ou como podemos insultar adversários com as divertidas “Taunts”. Acho que passei quase tanto tempo a personalizar a personagem entre sessões, como a jogar. Sobretudo porque ao evoluir a personagem, ganhamos mais cores, decorações, peças de armadura ou “Taunts”.

Em termos de modos de jogo, contem com os clássicos Team Deathmatch, Domination e Clan Arena, além dos divertidos modos Soul Harvest, inspirado no modo “Kill Confirmed” de Call of Duty, Freeze Tag, cuja dinâmica permite congelar inimigos e derreter companheiros congelados e Warpath, um modo de captura de zonas móveis. Passo imenso tempo a jogar ou Soul Harvest ou Warpath, os modos mais interessantes, quanto a mim. Um, porque é uma espécie de TDM mas que obriga a movimentar pelo mapa para apanhar as Souls, evitando os famigerados campers. E o outro porque é um modo sólido com objectivo comum às duas equipas, obrigando ao confronto. Freeze Tag, por exemplo, até tem potencial mas acaba por ter uma passada mais lenta e algo aborrecida.

Toda a acção decorre em nove mapas que possuem diversas mecânicas que transformam a jogabilidade. Além de portais para teleporte, há também rampas de salto, barris explosivos e de químicos, além de material radioactivo e fogo que causam dano. Os mapas dividem-se entre as bases da UAC e o próprio inferno, passando por mapas de espaços confinados como Disposal, a gigantescas arenas como em Sacrilegious. Todos os mapas partilham da mesma qualidade de design do modo carreira e aproveitam a excelente fidelidade visual, tendo uma performance estável com algumas (poucas) quebras de ritmo, causadas por um leve Lag que senti na plataforma testada (PS4).

E se esses mapas originais não chegarem, podem sempre recorrer ao robusto editor de mapas incluído, o SnapMap. Usando as mesmas peças e objectos que são usados nos níveis originais, podemos criar toda a sorte de espaços, dos mais simples aos mais complexos, com uma mecânica simples de “snap” de pedaços de cenário (daí o nome). Não vão construir porções do zero, mas sim “colar” objectos e salas pré-definidas. No entanto, embora possam recorrer a lógicas já existentes nos demais modos e mapas do jogo, é possível criar novos objectivos ou mecânicas. Infelizmente, esta ferramenta não tem o calibre de um editor completo, mas permite criar níveis muito interessantes. E, o melhor de tudo, é que as nossas criações podem ser partilhadas com os demais jogadores na comunidade, tornando o jogo quase infinito.

A curva de aprendizagem é algo acentuada, mas os tutoriais são bastante competentes para nos ajudar a construir um mapa lógico e credível. Pela comunidade vi mapas absolutamente fantásticos, alguns recriam até os níveis originais do DOOM de 1993, usando as mesmas texturas e modelos. Há mapas cooperativos para os jogadores lutarem por um objectivo comum, há mapas de combate em vagas (tipo Horde mode) e até mapas de simples obstáculos e plataformas para ultrapassar, sem tiros ou explosões. A imaginação da comunidade é fantástica e vão sair daqui peças de arte autênticas, estou certo.

Então e a nível técnico? Toda esta acção acima descrita passa-se num ambiente gráfico impressionante. Aquelas secções que falei que estão estilizadas com texturas e objectos do DOOM original são um excelente contraste com o jogo moderno em mãos. Que salto tecnológico demos nós desde 1993. Tudo neste novo jogo é polido e com atenção ao detalhe. Desde as bases da UAC repletas de instrumentos e computadores aos confins do inferno com repugnantes lagos de vísceras, é impossível ficar indiferente à qualidade visual deste jogo.

A nível de performance, este é um bom exemplo de como se devem reavivar jogos clássicos. A Id Software coloca todo o ambiente sombrio e visceral da acção em texturas, modelos, efeitos e animações absolutamente irrepreensíveis. Talvez a acção rápida não nos deixe apreciar tanto os cenários e algumas secções são tão sombrias que muita coisa pode passar ao lado. Mas não ficarão indiferentes à arte geral do jogo, sobretudo nas secções estilizadas do inferno. Na versão analisada na PlayStation 4, tive muito poucas falhas na qualidade visual, à excepção das tais quebras relacionadas com lag no multi-jogador e pontuais desfoques nas texturas no arranque dos níveis.

Veredicto

Uma campanha digna do jogo original, com a mesma lógica de dificuldade e velocidade do título de 1993, mantendo uma boa parte das mecânicas que aprendemos (a custo) a dominar. Talvez os modos online se desviem um pouco dessa “velha-guarda” que o modo campanha tanto faz questão de manter, tornando-se em algo diferente. Mas não ficamos desapontados por isso, porque até parece um jogo à parte. E uma vez que até temos um editor de mapas para criar e partilhar novos níveis, dá-lhe uma longevidade quase infinita. Tudo isto, embrulhado num jogo deslumbrante que tira partido do melhor que hoje se faz graficamente. Estou certo “mandar alguém para o inferno” tem agora outra conotação e até há quem queira mesmo ir lá parar com este DOOM.

  • Produtoraid Software
  • EditoraBethesda
  • Lançamento13 de Maio 2016
  • PlataformasPC, PS4, Xbox One
  • GéneroAcção
?
Sem pontuação

Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.

Mais sobre a nossa pontuação
Não Gostámos
  • Alguns problemas de Lag
  • Enredo acessório (como sempre foi)
  • Alguma repetição

Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.

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