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Análise: Absolver

Com um pontapé rotativo certeiro, este jogo da desconhecida Sloclap, uma equipa de ex-funcionários da Ubisoft, conquistou muitos fãs. Absolver podia ser mais um jogo de combate com artes marciais, mas é bem mais que um título de “pancadaria”.

As diversas fórmulas usadas por este título não são realmente novas. Também o género não é realmente novo, havendo outros jogos de acção com artes marciais por aí. Contudo, é na inteligente mistura de pormenores que este jogo se destaca. Vi muita gente compará-lo com as mecânicas de Dark Souls e já irão ver que há mesmo alguns paralelos. Contudo, não se fica por recriar esse lendário RPG de acção. Tem um sistema de combate único, algo complexo, mas bastante directo ao assunto. Há um convite para a evolução, para a aprendizagem pela prática que, no final, nos dá uma tremenda satisfação. Como em muitas das bases elementares de várias disciplinas de artes marciais, um discípulo tem de se inteirar da importância do equilíbrio entre a técnica e a meditação. Penso que nenhum outro jogo até hoje conseguiu recriar de forma competente este balanço do chamado “Yin Yang”. Vejamos se Absolver consegue.

Não há muito enredo para vos contar, na verdade. Não temos qualquer texto introdutório e os poucos diálogos são meramente descritivos, sempre escritos e sem voz. A ideia é que criamos um avatar, no que parece ser um culto de combatentes de artes marciais, provavelmente inspirado nos lendários Shaolin. Sendo iniciados no culto, pelos vistos precisamos de nos iniciar numas provas para mostrar o que valemos. Depois de sermos escolhidos há uma máscara que é energizada e que passamos a usar. Doravante, a nossa missão é explorar as ruínas de uma cidade, enquanto desafiamos e derrotamos outros iniciados como nós. Pelo meio, há alguns elementos bem mais fortes (bosses) e, por vezes, podemos mesmo ser desafiados por vários ao mesmo tempo.

Neste escasso enredo reside uma série de temáticas interessantes. A iniciação de um estreante inexperiente é um bom pretexto para nos obrigar a evoluir e melhorar cada golpe e cada portura. A nossa sensação de descoberta das mecânicas acompanha-nos, da mesma maneira que tudo é um mundo novo para o tal iniciado. Por outro lado, há uma clara metáfora de medição de valores, criada pelo desafio criado pelos restantes iniciados, artificiais ou jogadores humanos. Podia estar aqui durante horas a dissertar sobre este enredo e sobre a mensagem do jogo. É mesmo esse o efeito desejado deste argumento tão ambíguo. Enchemos o espaço vazio com a nossa própria interpretação do que vemos.

Essa interpretação do enredo está inevitavelmente associada às mecânicas de jogo que tentam replicar as filosofias básicas de várias disciplinas marciais. Há uma necessidade de constante equilíbrio entre a acção dos combates (Yang) e a meditação para evoluir a personagem (Yin), por exemplo. Nos primeiros minutos de jogo, é normal ficar um pouco confuso com a quantidade de teclas presentes e como as animações de cada golpe parecem aleatórias. Não são. Apesar de não haver uma explicação prévia das mecânicas, os minutos iniciais são dedicados a um sucinto tutorial sobre cada forma de interacção, não só do combate em si, mas também de todas as mecânicas associadas ao restante do jogo.

Começando pelo combate em si, o jogo utiliza dois únicos comandos para o ataque, além do próprio movimento da personagem e de teclas para desvio e para defesa. Um comando é um ataque primário, outro é um ataque especial mais forte. Notem que todos os movimentos e golpes da personagem usam uma barra de Stamina que, uma vez esgotada, nos pode deixar indefesos. Estes dois tipos de ataque estão também condicionados por quatro posturas seleccionáveis. Melhor, podemos seleccionar diversos golpes personalizados que variam de poder, velocidade e tempo de aplicação. No menu da meditação temos um separador para escolher esses golpes que queremos, que depois são aplicados com fluidez e em tempo real, dependendo da postura escolhida. Curiosamente, novos golpes surgem de cada vez que um adversário os aplica e nos defendemos dele. Genial!

Confesso que mesmo jogando na versão PC tive de ligar um comando Xbox One para interagir com este título (que, ironicamente, nem está disponível na consola da Microsoft). Isto porque, aplicar os golpes ou desviar/defender, até é simples com um teclado, mas não foi fácil de me habituar ao uso do rato para atacar e mudar de postura. No comando, a defesa com o gatilho esquerdo e a selecção de postura com o analógico direito, parece-me muito mais intuitiva, usando os botões para os ataques e desvios. A complexidade inicial deu lugar a uma fluidez quase baseada no instinto. Dei por mim a usar cada vez menos a opção de recuperar energia, simplesmente porque já não sofria tantos danos baseados na minha falta de experiência ou de paciência.

Notem que os próprios golpes mudam a postura, por isso, é bom que fiquem atentos e usem essa mudança para vossa vantagem. Também a abordagem aos adversários necessitam de uma estratégia inteligente. Não basta partir para a acção, uma vez que eles próprios também se podem desviar e defender, além de terem uma particular vontade de nos rodear quando surgem em número. Experimentem os diversos combos que quebram defesas. Podemos disferir um ataque inicial de murros certeiros, terminando num pontapé vertical, mas esta animação demora algum tempo e pode ser quebrada. Convém adaptarem-se mudando postura, esquivando, defendendo bastante e talvez até mudar os golpes de cada postura para criar surpresas desagradáveis aos que nos desafiam.

Podemos andar ao soco e pontapé por uma boa porção do mapa mas, de vez em quando, é preciso parar e perder algum tempo a meditar. Não, não estou a falar literalmente. Estou a falar de usar o menu de meditação do jogo. Aqui, não só mudamos as tais posturas e ataques das mesmas, havendo até uma demonstração visual de cada uma, mas também equipamos mais e melhor equipamento e gastamos pontos de evolução ganhos a cada novo nível. Existem diversas habilidades que vão melhorando com as nossas prestações em cada novo desafio. Força, resistência, velocidade, entre outras características são evoluídas exponencialmente cada vez que aplicamos um ponto. Por isso, convém meditar frequentemente ou seremos facilmente vencidos.

Evoluir e escolher equipamento, golpes e posturas de forma inteligente, se possível adaptando tudo ao nosso estilo próprio de jogo, é tão importante contra adversários virtuais… como contra jogadores humanos. Se optarem por jogar com ligação online permanente, irão encontrar alguns jogadores humanos espalhados pelo mapa na mesma missão que nós. A interacção com estes jogadores é perfeitamente ambígua. No primeiro dos encontros que tive com outros jogadores, acabámos por avançar os dois no mapa em simultâneo, numa acção cooperativa. No segundo encontro, o jogador ignorou-me completamente, mas o seguinte decidiu atacar-me sem dó nem piedade. Enfim…

A ideia é que poderão morrer frequentemente contra jogadores mais experientes, sobretudo que já tenham armaduras mais resistentes ou luvas e espadas que aumentam danos consideravelmente. É uma questão de atitude, deles e nossa. Podem sempre optar por jogar offline, no entanto, este jogo foi criado para ser jogado online, com esta mesma dualidade de critérios. Existem até uma série de emotes disponíveis, claramente criados para sermos amigáveis ou insultuosos. Depende da interpretação ou de como acordámos hoje de manhã, na verdade. Já agora, nesse mesmo menu há uma opção para convidar amigos para sessões cooperativas ou desafiar os mesmos para um duelo.

Ao fim de algumas horas a aprender novos golpes e a morrer contra jogadores irados, irão chegar a um ponto em que o jogo terá pouco para vos surpreender. Quando derem por vocês, estarão a desafiar o boss final e, finalmente, a deixar o estatuto de um iniciado. Com a derrota desse antagonista, chegamos ao grau de Absolver, tornando-nos mestres de uma escola. Aqui, poderemos ajudar novos jogadores a evoluir por ensinar-lhes novos golpes mais rapidamente, além de conferir alguns bónus. É uma ideia simpática para dar um papel aos jogadores mais experientes, dando uma mão na evolução dos demais jogadores. E, se quiserem um desafio ainda maior, experimentem os Combat Trials contra outros jogadores (via matchmaking) cuja vitória desbloqueia desafios ainda mais complexos.

A nível visual, pelo que podem ver pelas imagens que partilho, Absolver é um jogo com um design interessante, devidamente caricaturado em jeito de banda desenhada. As texturas e efeitos visuais de personagens e cenários possuem bastante simplicidade, mas são sempre competentes. O foco está, logicamente, nos movimentos e fluidez dos combates em si. Mesmo com as definições em Ultra (dependendo, logicamente, do vosso hardware), o jogo comportou-se sempre de forma impecável. Até mesmo online, nos encontros com outros jogadores, pareceu-me francamente fluido, havendo só umas curtas ocasiões de falha de sincronismo, mais baseadas na ligação online que propriamente no jogo em si.

Não há, de facto, muito para dizer contra o jogo. No rigor, pode tornar-se algo repetitivo como serão todos os RPG de acção lançados até hoje. Contudo, é uma questão de interpretação, quanto a mim. Há quem prefira a “repetição para ênfase”, sobretudo num jogo onde aprendemos por ver outros a lutar. A cada derrota, percebemos que é preciso insistir e aprender a ter paciência para atacar, defender e contra-atacar, repetindo a fórmula inúmeras vezes. No final, concordamos que esta repetição joga a nosso favor. No entanto, haverá sempre quem não goste de jogos repetitivos. Como disse, depende de como o interpretam e do quanto estão empenhados nesta carreira de lutador.

Veredicto

Com uma excelente estrutura de combate, aliada a uma evolução inteligente, muito dependente da persistência de cada um, Absolver é um dos jogos mais equilibrados que poderão experimentar actualmente. Tudo está assente em várias dualidades, combate e meditação, cooperação ou desafio, foco ou instinto, persistência e paciência, numa constante analogia ao que aprendemos da diversas filosofias de artes marciais. Brilha no online, seja simplesmente a interagir ou a desafiar outros. Visualmente é cumpridor, sem grandes “alaridos” técnicos, insistindo no que interessa realmente. Pode ser, de facto, algo repetitivo, mas mesmo essa repetição pode ser positiva. Depende da vossa dedicação.

  • ProdutoraSloclap
  • EditoraDevolver Digital
  • Lançamento29 de Agosto 2017
  • PlataformasPC, PS4
  • GéneroAcção
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Sem pontuação

Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.

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Não Gostámos
  • Algo repetitivo

Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.

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